quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

BEZERRO DE OURO - PARTE lV - Por Paulo Cilas

Em volta do bezerro a alegria se tornou contagiante. Um observador não necessariamente tão atento diria que “está tudo muito bem”, “que coisa maravilhosa”; um povo que há pouco era escravo, mais que 400 anos em terra estranha, agora tendo a liberdade, caminhando para sua própria terra. O que mais justificaria tanta alegria?

Entretanto nem sempre aquilo que parece ser motivo de alegria, ou que dê ao povo ações e reações de júbilo é o que Deus quer. Segundo o texto bíblico, não era barulho de vencidos ou vencedores, não havia nenhuma batalha conquistada, não ali. Era tão somente canto. Mas para quem?

Arão tentou, como vimos anteriormente, juntar o culto ao bezerro com festa a Deus; será que resta ainda dúvida sobre a real motivação de tais cantos, de tal alegria? A resposta vem com Moisés, aquele que já poderia ter morrido lá em cima, no cume. O defasado. O Moisés que não atende mais às expectativas do povo.

Ele chega e as tábuas que trazia consigo escritas com os caracteres com a lembrança de tudo o que ele ouvira de Deus, os mandamentos, foram agora despedaçadas ao pé do monte. Moisés não esqueceu naquele ato o que Deus lhe falou , mas o que seria para todo o povo, tanto as representações das tábuas bem como o que Moisés falaria foram perdidas ali. Se outro observador olhar essa cena, sabendo tudo o que se passa, diria “todos os dias ouvindo de Deus e toda instrução útil que de Deus se teria foi perdido.” Há de se recomeçar. Ao invés da boa instrução o que vem agora é repreensão. Nenhum passo adiante, o deserto se encomprida. Um povo livre, mas não liberto. O povo tirado do Egito, mas o Egito não tirado do povo. Quanto perdemos em não esperar, ouvir e aprender!

Cena que segue, Moisés agora repreende a Arão: “O que te fez esse povo para você permitir isso?” Arão ainda tenta justificar dizendo que o povo é mau e que ele se sentiu pressionado. Moisés, pesado de fala, é o estraga-prazer de plantão e o que vem a seguir é um absurdo: Aquele ajuntamento se tornou em divisão, irmão matando irmão, amigo matando amigo, vizinho matando vizinho. Podemos questionar porque Moisés deu tal ordem de destruição, podemos não entender, mas uma coisa é certa: divisão, sofrimento, gente contra gente só são provocados por aqueles que deixam Deus e buscam bezerros.

Particularmente, ainda não consigo conceber que muitos dividam tanto em nome de “Deus” e dizem estar fazendo a vontade de “Deus”, que estão louvando a “Deus”. Se todos estivessem esperando a Palavra que realmente vinha de Deus, se não quisessem erigir seus bezerros, que podem ter hoje as mais diversas formas (homens, instituições, prédios, ministérios...). Se...

Se na oração sacerdotal de Jesus Ele afirma que se o povo fosse um, o mundo saberia que o Pai o enviou, justifica o fato de tantos não crerem em mais nada. “Arão" precisa entender que os caminhos de Deus não passam pelo bezerro, e nem se deve sucumbir aos desejos de um povo inquieto. O apóstolo Paulo adverte: “Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si mestres conforme as suas próprias concupiscências”. Talvez precisemos de mais Moisés não tendo vergonha e nem hesitação de suprimir a Palavra por um pouco para não misturar o santo com o profano, levar o povo a um reconhecimento de erro, afinal foi Jesus quem disse: “Não deis aos cães as coisas santas, nem lanceis pérolas aos porcos” (MT. 7.6).

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

BEZERRO DE OURO - PARTE lll - Por Paulo Cilas

Diante da insistência do povo, Arão, tomando as argolas de ouro e formando o bezerro, agora se depara com uma dificuldade ainda maior: “Quando o povo vê o bezerro pronto começa a bradar - São estes, oh Israel, os teus deuses que te tiraram da terra do Egito”. Arão diante de tal afirmação imediatamente levanta um altar e diz “- Amanhã será festa ao Senhor”.
O que vemos é que não dá para ceder nos princípios fundamentais da fé porque isso nunca termina bem, como veremos em outro momento. É um abismo chamando outro abismo. Arão concordara com o bezerro e agora tenta conciliar o culto ao bezerro com o culto também a Deus. No dia seguinte eles madrugaram com holocaustos e trouxeram ofertas pacificas. É bom observar que eles continuavam cumprindo princípios de um culto normal. O engano se deu e se dá ainda hoje da mesma maneira quando também muitos continuam a cumprir obrigações e atos de culto. Textos bíblicos são aplicados, princípios são ensinados, contudo as imagens dos bezerros modernos estão ali envolvidas. Então percebemos que a pratica normal de culto se torna uma sombra, uma cortina de fumaça que na verdade apenas encobre o erro maior cometido no meio do “arraial”.
Está escrito que de Deus não se zomba e que Deus não dá Sua glória a ninguém. Sendo assim é inútil tentar conciliar bezerros com Deus. E não adianta a alegação que tendo um chamariz forte fica mais fácil reunir o povo para então falar de Deus. Não é assim que vemos em toda Bíblia Deus agir. Jesus em certo momento, vendo que muitos discípulos tinham desistido de estar com ele, pergunta aos que ficaram se eles também não queriam se retirar ao invés de oferecer algum incentivo para estes ficarem e para aqueles voltarem.
Muitas vezes, olhando as muitas reuniões repletas de pessoas que cantam e pulam, que choram, logo pensamos que é um culto genuíno a Deus. E será, se o que motiva o povo a isso não for um líder admirado, uma música apelativa, uma mensagem empolgante, porém sem consistência bíblica e com muitas promessas humanas duvidosas. Então, se está escrito que “Só ao Senhor adorarás, e só a Ele prestarás culto”, o culto só é legítimo com essa consciência. O Senhor como o centro, sem dividir a atenção com nada e com ninguém.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

BEZERRO DE OURO – PARTE II – Por Paulo Cilas

Sem saber como aguardar as instruções de Deus para o prosseguimento de sua vida, o povo agora tem de eleger uma referência, algo que lhe sirva para animar a vida ali, dar sentido aquele ajuntamento. Então o povo vai a Arão, o sacerdote, e simplesmente diz: “Faça-nos deuses que vão adiante de nós” (Ex. 32.1).

Repare que para pedirem uma referencia nova, precisam dizer que Moisés morreu, já que demora. Assim também é verdade que muitos começam a dizer que a igreja está morta, está fria – situação que muitas vezes foi verdadeira na igreja, mas quem providenciou um avivamento foi Deus, e não o homem. O mover de Deus desperta – e com esse argumento de “morta e fria” precisam aquecer sempre de um jeito. Jeito, normalmente, artificial, megalomaníaco, fundamentado em artifícios.

Arão, em seu primeiro vacilo diante desse quadro, sentindo-se pressionado, diz: “Tirem as argolas de ouro [...] e tragam a mim” (Ex. 32.2). Isso é fantástico! Salomão iria dizer que não há nada de novo debaixo do sol, o que foi, é o que é, e o que volta a ser. O ouro está sempre envolvido nesse chamado, despertamento, novo sentido!

Cegadas pela impaciência as pessoas entregam o ouro, literalmente. E muitas fazem com uma devoção surpreendente, uma convicção que parece ser legitima. É quase sempre certo que a entrega do “ouro” é representada mesmo em valores, dinheiro etc. Pense que muitos novos programas de televisão, principalmente de uma igreja com visão “de ampliação”, “de conquista”, “de abençoar todo povo” começam com o seguinte discurso: Esse é um programa para abençoar a tua vida, a tua casa, a tua família. Vai abrir portas... diversas portas” . Logo depois, o discurso muda: “Ajude a manter esse programa! Seja uma coluna! Deus irá te abençoar se você o fizer”.

Enfim, tudo termina na entrega do “ouro”. “Textos, fora de contexto, usados como pretexto”! Essa frase que sempre ouvi, explica bem a maneira de como isso se opera. Textos bíblicos isolados, muito mais do que fora do contexto, estão fora do Espírito da Bíblia, são palavras de ordem ditas com muito autoritarismo humano, e nenhuma autoridade espiritual. Alias, a palavra “espiritual” é muito usada também.

E assim, não entendendo a importância de um crescimento natural e contínuo, desejando até mesmo ações de Deus contudo desprezando o que de Deus já se tem e com um Arão sincero porém claudicante, o bezerro vai sendo erguido. Mas, o mais triste é que, além do ouro, as pessoas entregam suas próprias almas, tornando-se sem identidade. E, em alguns casos o que vemos é uma unidade de manada em desenfreada carreira, repetindo chavões requentados com pompa de coisa nova e dominada por um culto que não é a Deus. Massa de manobra. O culto racional aconselhado pelo apóstolo Paulo passa ao largo. E esse é o valor maior que se perde. Porque não há nada mais triste do que ver alguém seguindo e repetindo mecanicamente seus Bezerros, sem ter senso crítico, pois não julgam tudo, como é recomendado pelos profetas, pelos apóstolos e principalmente por Jesus, à luz da Bíblia.

Ouro e alma confiscados.

O culto só pode ser a bezerros.

Obs. Na terceira parte: Como Arão, sendo sacerdote do Senhor, tenta conciliar os cultos.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

BEZERRO DE OURO - PARTE l - Por Paulo Cilas

Para nós parece estranho que o povo hebreu logo após ser tirado da escravidão do Egito quase que imediatamente erigiu um bezerro de ouro para adoração. Entretanto, a realidade daquele povo não está distante de nossa própria realidade. Os sentimentos, os interesses e os maus costumes dele são comuns em nossos dias também. Talvez não nos apercebamos disso porque não há um bezerro, literalmente, dando forma a nossa conduta também estranha.
Passemos então a considerar os passos que antecederam a criação do bezerro bem como também os fatos durante a existência do mesmo:

Agora o povo já se encontrava livre do Egito e tinha pela frente a caminhada até a terra prometida. Os hebreus passariam definitivamente a existir como nação. Tudo deveria estar bem mas...
O plano de Deus não era simplesmente político geográfico. O plano não era a formação de uma nação - povo e terra -, mas, sim, a formação de uma nação com o caráter de Deus. Um povo diferente de todos os outros povos. E para isto começar a acontecer Ele, O Senhor , chama Moisés à parte para lhe passar instruções. Pois bem, o que vem a seguir é muito parecido com o que acontece o tempo todo na caminhada de preparação também do povo que herdará a terra e a eternidade. O povo não sabe ficar quieto. O povo não sabe esperar. O povo não sabe acordar a cada dia e vivenciar sua existência com todas as complexidades embutidas.
No Egito, como escravos, não havia tempo nem oportunidades -se havia, eram raras- para a revelação de caprichos e maldades, mesquinharias e invejas. E tantas outras perniciosidades que povoam o interior de cada um. As chibatas e o trabalho escravo passavam somente a imagem de que todos eram vítimas inocentes.
Agora não. Dia a dia o povo teria de estar às voltas com temperamentos diferentes. Aprender a partilhar, perdoar, entender e compreender a si mesmo e os outros. Mais ainda e sobre tudo: Teria de aprender a confiar em Deus. E isto só, deveria bastar.
Entretanto, a disposição dos hebreus não foi essa. Diante da demora de Moisés eles sentiram a necessidade de algo que os motivasse. Bem parecido quando nós, hoje, em nossa caminhada, já não temos mais ânimo para o culto, para a vida relacional com os outros, para a formação de nosso caráter, para aprender aquilo que já ouvimos há muito e que não conseguimos inteiramente colocar em prática. Então, precisamos de novidades para nos estimular e sem perceber, vamos erigindo nosso Bezerro de Ouro moderno.
No Egito, os hebreus tinham sido influenciados pelas várias formas de culto a vários deuses, e a imagem do bezerro era algo comum a eles, era uma das referências que eles tinham e agora erigiam um "boi novo", ou seja, um deus novo. Hoje, como estamos no mundo, também vamos formando bezerros modernos que podem ter várias formas, ou simplesmente ideias. Exemplos: As tantas novas visões, as unções, as frases de efeito, as palavras de moda, os líderes carismáticos, as potências eclesiásticas, as megas igrejas, as inúmeras campanhas, tudo para motivar o povo que não sabe esperar, ouvir, aprender e viver a cada dia.
E se algo extra o Senhor quiser mandar, Ele, o Senhor, mandará. Como a Shekinah - a glória que vinha sobre o tabernáculo. E é simples assim! O Senhor manda, não precisamos fabricar nada. Não precisamos impor nada. A nós, dia a dia, o Senhor nos ensina a caminhar aqui enquanto nos preparamos para chegarmos do outro lado.

Na próxima parte, abordarei como construímos o "bezerro". O que entregamos para ele.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

REALIDADES: DURAS E SUBLIMES.

MINHA FILHA FOI SEQUESTRADA E ASSASSINADA… E Deus?...
To: contato@caiofabio.com
Sent: Wednesday, September 30, 2009 12:29 am
Subject: luto e Paz

Anapolis, 29 de setembro de 2009.


Querido pastor Caio Fábio,

Eu sou uma mãe que acaba de perder uma filha linda, maravilhosa de 26 anos, com apenas cinco meses de casada... Hoje faz sete dias que a perdemos...
Ela era poesia, cor, música e sensibilidade...
Nós somos uma família que conheceu Jesus quando as nossas três meninas tinham entre três e oito anos. Passamos por grandes lutas e desafios e congregamos na igreja presbiteriana do setor sul de Anápolis com o PR Ronaldo Cavalcante.
Caio Fabio, seguimos os seus passos todas as vezes que você esteve por aqui.
Quarta feira passada por volta das 13 horas meu marido me falou que tínhamos que ir para Goiânia porque a nossa filha do meio, a Polyanna, tinha desaparecido...a minhas pernas sumiram....mas eu levantei e entrei no carro para ir para Goiânia pois ela morava lá e estava casada e feliz.....
Apenas com 26 anos a publicitária mais conhecida da cidade por causa da sua alegria e capacidade de incentivar empresários a acreditarem em seus próprios negócios.
Os homens da família foram para a delegacia... e nós as mulheres da família ficamos 30 horas orando, clamando a deus e esperando o pedido de resgate, tendo em vista que o caro já havia sido encontrado com seus pertences dentro e o mesmo havia sido queimado para apagar provas e digitais, dificultando o trabalho da policia...
Oramos sem cessar e ouvimos, e lemos a Palavra; e tivemos a certeza de que o resgate seria pedido e esperamos que ela voltaria para nós e com sua tremenda capacidade poética e criativa e como uma menina apaixonada por Jesus ainda escreveria um livro para promover quebrantamento e conversão em muitas vidas....
A única palavra que eu queria ouvir nestas 30 horas de vigília e emoção, aflição e angustia profunda era: "a encontraram"...; ou um toque de telefone com o com o pedido de resgate...
Finalmente alguém entra naquela casa onde estávamos amigos e parentes amontoados na sala escorregando do sofá para o chão, então ouvimos: “achou”, mas foi encontrada morta com dois tiros...
Acabei de ler sobre o amor de pai que agradece a deus por saber que seu filho, para ficar livre desse mundo, tenebroso chamado por Jesus... Não consigo neste momento ter este sentimento de gratidão porque tendo certeza de que não era esse o desejo dela também...
Nós todos estávamos fazendo uma campanha de oração e eu sei quais eram os planos dela para o futuro... Planos de paz, de criação, de crescimento, para que o mundo conhecesse o talento gratuito que deus lhe deu...
Não posso considerar que a minha não aceitação é egoísta... ela queria viver aqui com o seu querido marido a lua de mel que a esperou por 8 anos, ela queria ter filhinhos e levá-los para jogar bola com o avô que não teve meninos, só meninas, ela queria realizar sonhos comunitários.
No ano passado ela criou um site: http://www.amigoinedito.com.br/ para movimentar os internautas a fazerem boas ações e registrarem seus depoimentos neste site.
E agora... Eu entendi a resposta que deram para o “mano”, mas voltar a falar com deus esta difícil demais...
Ainda não sabemos quem foi o sujeito que atirou nela, mas eu não posso acreditar que foi vontade de deus... se foi o ódio do inimigo das nossas vidas eu pergunto por que Jesus deixou assassinos interromperem a caminhada de uma mensageira de Deus ???
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Resposta:

Minha irmã amada: Graça e Paz!

Do meu ponto de vista..., Adão não deveria ter pecado; Caim não deveria ter matado Abel; os filhos de Caim não deveriam ter construído Babel; Cão não deveria ter “abusado” na nudez do pai, Noé; Abraão não deveria ter gerado filho de sua serva, Hagar; Jacó não deveria ter enganado Esaú e nem Esaú deveria ter trocado a “bênção” por um prato de lentilhas; os filhos de Jacó não deveriam ter traído José; Moisés deveria ter entrado na Terra de Canaã; a filha de Jefté não deveria ter sido morta pelo voto do pai; Sansão não deveria ter morrido daquele jeito; Davi não deveria ter surtado nunca; e, por isto, não deveria ter perdido nenhum filho; Isaías não deveria ter sido serrado pelo meio; a mulher de Ezequiel não deveria ter sido morta como parábola para ensinar os incrédulos; Oséias não deveria ter sido tão infeliz no casamento; os inocentes deveriam ter sido poupados em todas as chacinas; nenhuma criança deveria ter morrido pela ambição dos adultos; nenhuma mãe jamais deveria ter comido seus filhos no auge da fome; João Batista deveria ter vivido vida longa e honrada, ao invés de acabar sem cabeça em razão de uma bunda bonitinha; Jesus, O Verbo, A Palavra, não deveria ter sido morto; a Ressurreição não deveria ter sido tão discreta...; os apóstolos, como Tiago irmão de João, não deveriam ter sido mortos por nenhum capricho [e todos foram...]; Paulo não deveria ter sido morto justamente quando os cristãos mais precisavam dele; milhares de testemunhas também nunca deveriam ter morrido uma morte sem sentido, banal; enquanto os maus prosperam; enquanto a injustiça foge do juízo; enquanto a verdade é pisoteada; enquanto a maldade se torna poder; enquanto gente boa some... sem explicação...
Sim, entregue a minha visão menor do que a de uma ameba e mais egoísta do que eu mesmo consigo discernir a profundidade do egoísmo, eu poderia consertar o mundo; impedir todas as injustiças; ajudar Deus a ser Deus; determinar o melhor pro mundo, pros meus filhos, pra minha vida; enfim, eu, entregue a mim mesmo, seria tão cheio de boas idéias..., que ninguém que eu amasse morreria; sim, ninguém...; e se morresse seria com meu consentimento, entendimento, compreensão e apoio a Deus na Sua soberania!...
Ah, se eu fosse o Deus do mundo ninguém morreria; ou, então, ninguém que eu gostasse; e, da minha casa, certamente ninguém morreria; não enquanto eu estivesse vivo...
Eu, todavia, há muito aceitei e vi que de fato não vejo; percebi que de fato não discirno; entendi minha limitação de entendimento; constatei que meu melhor amor é ainda por mim mesmo e por meus sonhos; aprendi que meus amores são “meus” e por “minha causa”; pois, morre o vizinho, e não sinto; morre o jovem da esquina, e logo esqueço; milhares são vitimados, e eu apenas lamento; o mundo acaba em vários lugares da terra, e eu agradeço que não seja AQUI...; e, aqui, é onde moro, vivo; e AQUI não posso conceber que aconteça o que no mundo inteiro acontece...
O que não dá é para sofrer em nome de sua filha os sofrimentos que ela não está sofrendo...
Sim, pois você queria ver a sua filha casada e feliz no casamento; tendo filhos; se realizando profissionalmente; etc... Esses são os seus sonhos e um dia foram os dela... Mas saiba: AGORA já não são [...] mais sonhos dela, mas apenas seus [...] por e para ela...
Hoje, para ela, o melhor marido é nevoa perto da Glória; a melhor lua de mel é amarga se comparada à alegria dela; os filhos mais lindos são miragens quando comparados aos encontros de amor que ela está tendo; as realizações profissionais que lhe orgulhariam, hoje, agora, para ela, são as canseiras e os enfados que cessaram...
O problema é que você não teve tempo para se realizar nela!...
É claro que a dor é indescritível... E ninguém pode dizer que não conheço tal dor... Mais de uma vez...
Todavia, é como pai que perdeu filho; como filho que perdeu pai; como irmão que perdeu irmão; como amigo que já perdeu milhares de amigos, que lhe digo que meus sentimentos seriam todos como os seus, não fosse o fato de que discerni faz tempo, que a maior dor dos enlutados é ainda egoísmo pelo outro [...] cuja alegria está plena, mas não a nós...; e, também, vi que tais sentimentos são todos o resultado de minha vontade de me ter nos meus filhos, de me reproduzir neles e assistir tal fato; ou seja: descobri com toda honestidade que minha frustração era não poder gozar a vida neles [...], nos que foram...
Entretanto, hoje, o que lhe digo parece sem coração e fácil de dizer...
Mas não é...
O que é então que me faz dizer o que digo?...
Ora, é a simples coerência com a fé que professo; é a simples coerência com Jesus; é a simples coerência com a existência que mata os homens dos quais o mundo não é digno; é coerência com João Batista, que não era inferior ao meu filho Lukas, e, mesmo assim, morreu por um capricho...
O que posso lhe dizer é que somente a transcendência da fé que se projeta para a Vida que é, sim, somente tal poder pode nos fazer vencer tal dor; a qual, por mais legitima que seja, sempre mistura amor e egoísmo; sempre mistura fé com privilegio; sempre crê que a vida eterna é uma belezinha apenas para quando a gente estiver caquético...
Leia os evangelhos e veja se é justo você pensar que a vida dos discípulos de Jesus esteja para além da calamidade!...
Sei que no momento minha resposta chega a você como vinagre na ferida... Infelizmente, no entanto, não tenho consolações vazias; e nem digo a ninguém o que Jesus jamais disse... Jesus nunca consolou ninguém dizendo “Que Pena! Tão Novinho!”...
Na realidade, ao olhar o mundo, mais creio e internalizo como verdade a declaração que diz que é preciosa aos olhos do Senhor a morte dos Seus santos!...
O que eu digo [...] você não entende agora, mas compreenderá depois!...
É justo e sadio chorar os nossos amados...
O que não é certo é perguntar por que em mundo que mata tanto todos os dias, gente que amemos também possa e venha a morrer?...
Além disso, o fato de ter sido um seqüestro seguido de assassinato, do ponto de vista de Jesus, não muda nada; posto que Lhe tenham falado das desgraças e maldades praticadas por Pilatos, ou do acidente idiota na Torre de Siloé, e, a tais narrativas, Ele não acrescentou nada em especial; visto que Dele não se tenha havido um “Oh!”; ou um “Ô”; ou um “Que coisa!”...
Não! Ele apenas disse: “Se não vos arrependerdes, todos igualmente perecereis!”...
O fato é que Jesus não tem misericórdia e pena por ninguém que esteja partindo desse mundo para a morada do Pai!
Você teria?...
Sinto saudades... Choro... Abraço as memórias... Beijo meu filho no meu coração todos os dias... Mas não o traria de volta se pudesse... Sim, jamais desejaria a ele tal maldade de tê-lo de volta a esse mundo, uma vez que dele meu filho esteja livre para sempre...
Você acha mesmo que o sucesso Publicitário é para comparar com o nome dela publicado no Livro da Vida?...
Seu olhar está enterrado neste mundo, e, por isto, fica impossível hoje para você o alegrar-se na Glória de Deus!
Entretanto, eu lhe digo:...
Se tais “perdas” não nos projetarem para Deus pelo menos pelo afeto eternizado por filhos que já se foram para a Casa Eterna, pergunto: quando então se amará a eternidade ainda vivendo neste mundo?...
Será que um crente só deseja e celebra a eternidade quando o câncer já comeu tanto os órgãos, que a dor é tão desesperadora que a pessoa quer ir para Deus não por Deus, mas apenas para ficar livre da dor?...
É mesmo assim?...
Deus é apenas uma alternativa ao desespero da dor sem cura neste mundo?...
Ora, se é assim Deus ainda não é amado por nós!...
Chore! Chore! Chore! Pois dói demais!...
Mas chore enquanto vê sua filha em Glória; e, portanto, ao chorar, chore por você e não por ela; posto que se ela visse você lamentando a gloria dela, ela lhe diria:
“Mãe! Você não viveu para a minha felicidade?... Então, por que se entristece com minha plenitude em Deus?”
Além do que já disse, não tenho nada para dizer a ninguém e nem a você, minha amada irmã no Evangelho e no luto!...
Entretanto, sei que somente o Espírito Santo pode tornar alguém apto para discernir [...] e se consolar com tais realidades invisíveis...
Oro por você e pela sua casa... Oro pelo seu genro... Oro para que vocês se gloriem na esperança da glória de Deus, conforme se mande que seja para quem de fato crê em tudo o que confessa como fé em tempos de bonança...
Receba meu amor e minha solidariedade!

Nele, que ama nossos filhos mais do que em nosso egoísmo a gente consegue conceber o que seja amor,


Caio

terça-feira, 15 de setembro de 2009

PARA NÃO DIZER QUE EU NÃO FALEI DAS FLORES - POR PAULO CILAS

Essa música de Geraldo Vandré marcava uma era de revolta e insatisfação contra um regime político. As flores do título representavam a possibilidade de liberdade, uma liberdade ideológica que talvez só trocaria um regime ditatorial por outro. As flores na música poderiam ser tanto um desejo verdadeiro de justiça e liberdade como a anarquia de muitos que abraçavam uma luta sem nem mesmo saber do se tratava e tudo que a envolvia. Mencionar as flores serve para esse fim politico, como também, na pena de um poeta, exprimir sentimentos: “As rosas não falam, elas exalam perfume”...
Mas, quero falar de outras flores. Flores que estavam no Jardim do Éden, sejam as flores de um canteiro, sejam as flores que prenunciam os frutos. No Jardim da Perfeição, elas presenciaram tal perfeição ser contaminada, agredida, transformada e transtornada por uma atitude rebelde. Uma desobediência de quem não deveria obedecer por obrigação, mas por ser a melhor maneira de continuar caminhando entre as flores no jardim. Com a queda, as flores choraram. Não sei se foi aí que, junto com as rosas, apareceram também os espinhos. Fato é que está escrito que os cardos e abrolhos apareceriam também.
Salto a cena e vou para outro jardim, Getsemani. As flores desse jardim contemplam agora o Perfeito, o Cordeiro Imaculado experimentando a agonia, a angústia, a comoção que o faziam suar sangue. As flores, agora nascidas em terra impura, contaminada pelo mal, também aguardam ansiosas que Ele vá até o fim, que Ele complete a sua missão e promova a redenção de toda a natureza que geme.
No primeiro jardim, o lugar era perfeito, o homem caído o contaminou. No segundo, “O Homem” era perfeito, e mesmo tendo tudo contra, Ele “fez seu rosto como um seixo”. Sinal de determinação de quem iria para a consumação de tudo. “Pelas suas pisaduras somos sarados” e Ele olhará a nós e as flores, e com elas toda a criação e “verá o fruto do seu penoso trabalho”.
“Aparecem as flores na terra, chegou o tempo de cantarem as aves e a voz da pomba ouve-se em nossa terra. A figueira começou a dar seus figos e as vides, em flor, exalam seu aroma” (Ct.2.12,13)
Feliz Primavera!

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

VASOS DE BARRO - POR PAULO CILAS

" Temos esse tesouro em vasos de barro, para que a excelência da glória seja do Senhor e não nossa." 2 Co.4:7Praticamente vivi minha vida no ambiente de igreja. Posso dizer com tranquilidade (minha tranquilidade) que o maior problema que observei foi e é a insana tentativa da igreja em se tornar vaso de ouro: valioso e forte. Vi muitos se definhando na tentativa de serem melhores. Vi outros tantos frustados pelo caminho por terem falhado em algum momento. Pior, talvez: vejo uma grande massa vagando como aves migratórias buscando agora aquela "igreja" que enfim vai fazê-la imbatível, definitivamente invulnerável. E eu disse pior anteriormente? Acho que me enganei. Provavelmente o pior é ter visto inúmeras vezes "gente perfeita" apedrejando os fracassados impuros, indignos de estarem juntos de uma estirpe sacrossanta.E, enquanto a compreensão do que é ser vaso de barro não vem, vamos deixando de cumprir princípios maravilhosos da excelência de Jesus em nossa existência. Chorar com os que choram fica inviável porque temos que ensinar aos que choram palavras, declarações e meandros da doutrina para que tais não se mostrem tão frágeis, afinal, "nosso Deus é forte e o diabo já está vencido". E seguir o conselho de Paulo aos Gálatas, então? No cap.6:1 ele diz que os espirituais devem restaurar em mansidão o pecador surpreendido . Deixamos ainda de compreender a Nova Aliança, que é perfeita, já que ela está disposta sobre pelo menos duas verdades centrais: a nossa total incapacidade em cumprir as regras da Antiga Aliança e a Graça indescritível revelada em Jesus que nos aceita como somos, barro. E ainda por cima vamos criando novos rituais pelos quais consigamos nos tornar "vasos de ouro".Mas percebo que é difícil admitir nossa fragilidade. Dói muito reconhecer limitações, mesquinharias, vontades oportunistas e interesseiras travestidas, muitas vezes, ora até mesmo de piedade em nome de Jesus, ora de autoridade espiritual. Dói assumir que mesmo "maduros",vacilamos. Para muitos isto é por demais decepcionante.Já para outros a dificuldade reside em abrir mão da aparência sempre vitoriosa uma vez que o mercado tanto secular como religioso assim exige. Não há lugar para fracos!Agora, não importando as razões ou a falta delas que nos impedem de enxergarmo-nos como vaso de barro, o triste é desperdiçar a riqueza do tesouro do qual Deus nos fez receptáculo. Não é de admirar o porquê que muitos rejeitam Jesus, o porquê de querermos tanto ganhar esta vida aqui. Parece que esperamos em Deus somente para esta vida. Enfim, tudo contrário ao que está escrito na Bíblia. Somos nós querendo ser vasos valiosos desprezando com isto a excelência do Senhor e o tesouro nos dado graciosamente.

FAST FOOD - POR PAULO CILAS

Antigamente as lanchonetes serviam para que alguém, sem tempo para uma boa alimentação, "enganasse o estômago". Era o tempo em que a coxinha de galinha vinha com o osso da própria galinha como suporte; era o tempo também em que vinha mais galinha e menos massa. Pois bem, o tempo passou e o que deveria ser um "quebra galho" tornou-se cada vez mais efetivo, ou seja , mesmo tendo tempo para almoçar ou jantar, muitos continuam a preferir o que se passou a chamar fast food - comida rápida; que embora dito rápida teve tempo para novas criações e logo foram popularizados os "burguers", as pizzas, shakes e outros. E todos eles com cheiros estonteantes, aparências soberbas e paladares arrebatadores. Resistir, quem há de?Mas, vieram as consequências de uma alimentação desequilibrada . Obesidade, colesterol alto e outros efeitos igualmente perniciosos.Lamentavelmente, a mesma sanha por soluções rápidas ou por coisas que agradem nosso olfato, visão e paladar "espirituais" nos levou para longe de hábitos realmente salutares para nossa vida espiritual. Verdadeiramente os demônios expulsos nos alegram mais que o nosso nome escrito no livro da vida. As "campanhas" tornaram-se mais fundamentais do que o aprendizado contínuo da Palavra de Deus. Os pregadores de uma nova receita (visão ou unção) ficaram imprescindíveis nas cozinhas eclesiásticas. O resultado? "Crentes" pesados demais, às vezes com muita energia, mas pouco nutriente. Muita comida, mas pouco alimento. Totalmente em desequilíbrio!Sei que pizza ,"burguers" têm seus encantos, são até legais em algum momento. Entretanto, essencial mesmo é o cardápio do Senhor. Sempre balanceado e que jamais cede à nossa gula e preferências.Paulo Cilas

A HUMANIDADE DE DEUS - POR PAULO CILAS

Civilizações passadas e presentes sempre buscaram e buscam as alturas, o sobrenatural. Mas ao homem caído tornou-se impossível chegar a Deus. Daí a existência de tantas religiões e tantos deuses. Daí também o ateísmo. Sim, com um amontoado de perguntas sem respostas mais as contradições e manipulações das religiões principais, cresceu o ateísmo. Contudo, também os ateus vivem buscando algo que lhes satisfaça. Assim , todos igualmente erram em sua busca, pois quase que invariavelmente a mesma se dá para obtenção de benefícios e outros interesses e não por humildade de quem sente falta do PERFEITO.E, em sendo impossível ao homem voltar a Deus, Deus veio ao homem. Quando o Verbo se fez carne, Deus em Jesus passou a ter pela primeira vez endereço conhecido. Fosse nos dias de hoje, cep, logradouro, estariam incluídos. "E todo espírito que é de Deus declara que Jesus veio em carne" (1Jo.4.2).Em Jesus, Deus sentiu nossas limitações: "O espírito está preparado, mas a carne é fraca".Em Jesus, Deus compreende nossa vergonha diante de uma caixa de remédios. Então, insiste pela palavra e pelo Espírito que podemos nos curar dos males que tantos danos causam.Em Jesus, Deus "tenta nos ensinar a misericórdia, perdão e amor:- A força e o poder de Deus não se revelam somente na cura, mas , também na visita ao enfermo.- Não somente na aniquilação do motivo da dor, mas também no bálsamo da solidariedade.- Não somente no evitar o açoite, mas também no untar as feridas, socorrer no caminho.Entender isso, penso, nos leva ao poder que se aperfeiçoa na fraqueza. Com certeza precisamos humildemente conhecer nossa carne, nossa humanidade débil. Como Deus conheceu em Jesus."temos um sacerdote , que embora não pecando, sabe o que é viver na debilidade humana e por isso se compadece de nós"Hb.4:15.

UM GRANDE MILAGRE - POR PAULO CILAS

Tal qual no tempo de Jesus na terra, a multidão está em busca dos milagres. E Jesus continua como antes querendo operar um grande milagre. Entretanto, querer ouvir do Mestre que milagre é este a maioria não quer. A maioria, talvez nós incluídos, está fazendo um grande barulho com clamores, choros públicos e campanhas diversas numa tentativa de, quem sabe, colocar suas petições nos primeiros lugares do atendimento divino. Afinal temos ouvido e lido “como fazer para que o Senhor dos impossíveis” nos ouça. Então, por que ouvir o que Ele tem a dizer se o que nós temos a dizer a Ele é mais importante? E, ainda por cima, os milagres que esperamos Dele “engrandecerão o seu Nome” e muitas pessoas vão se converter. Se converter a quem? Ora, converter-se ao senhor dos impossíveis, dos milagres. Serão mais pessoas para ouvir que Ele quer operar um “grande milagre.”.Nota: Alguém disse recentemente que os grandes pregadores atuais – apóstolos, bispos e outros auto denominados-deveriam ir aos muitos hospitais públicos caóticos e aos lugares que nem tais hospitais existem e nesses lugares exercerem gratuitamente seus prestimosos dons e unção para alívio do povo ao invés de fazerem propaganda de que a benção só será recebida em seus domínios onde seus nomes e fotografias abundam. Tudo isto para glória do... Senhor, claro.Sim, irmão está vendo muito mais pessoas nos templos humanos e muito menos pessoas transformadas por Jesus. Isto não é um fenômeno atual, todavia existindo agora em profusão.Certo é que todos queremos manifestações poderosas e exteriores: dinheiro, curas, familiares seguros e bem resolvidos, dinheiro... Queremos viver sem arranhões nem feridas profundas. Queremos viver só de risos com aquilo que nos satisfaz. E que todo inimigo espiritual ou humano caia por terra “porque somos cabeça e não cauda’”.Mas... E o grande milagre que Jesus quer operar em nós, qual será? Se quisermos ouvir o que Ele tem a dizer ouviremos: “um coração transformado por Ele mesmo”. Que encontra alegria, força, fé, esperança, amor, paciência a despeito dos fracassos familiares, financeiros, físicos, emocionais e sentimentais. Um coração que entenda que “embora no mundo tenhamos aflições, as mesmas não podem ser comparadas com a glória que nos há de ser revelada em Cristo Jesus”!Creio que tendo tal entendimento podemos clamar pelas demais coisas. Se não, vamos parar com o barulho e ouvir O Senhor. Quem sabe descobriremos Dele que os nossos anseios e necessidades são oportunidades que Ele pode usar para operar um grande milagre. Ou quem sabe, O MAIOR MILAGRE!

MORTE E PRODUÇÃO DE VIDA - POR PAULO CILAS

Recentemente vivi novamente o enfrentamento com a morte. Morreu uma moça aos vinte e dois anos de idade. E o fato de morrer tão jovem aliado às circunstâncias nas quais ela estava vivendo me levaram a uma reflexão: o que é realmente viver?A reflexão - a morte quase sempre nos faz mais reflexivos - fez-me ver que realmente "para morrer basta estar vivo". Tamanha obviedade deveria instalar em nossas mentes (razão) e corações(sentimento) um sentido e valor reais da vida e, principalmente, do que é viver.Ao morrer alguém que está fora da "comunhão", logo vem a pergunta: "E aí, está salvo(a)?". Quanto a esta questão, tenho aprendido a dizer que não importa o que achamos, tudo já está definido com o Justo Juíz. Entretanto, podemos questionar para aprendizado sobre o que exatamente foi feito da existência: O que ela produziu? O que ficará daquele que se foi?Sabemos que o tempo de vida aqui nem sempre corresponde ao que se produz. Alguém poderá viver até a velhice e nada produzir e alguém poderá viver pouco e muito produzir. Sendo assim, não creio que apenas vivemos aqui para definirmos a vida além, embora faça parte de um processo natural. Nós vivemos aqui ,ou deveríamos viver, fazendo com que de dentro de nós germinassem bons frutos . De perdão, amor, generosidade, humildade, respeito, enfim, fruto do Espírito, coisas de cima, do Reino de Deus. Com tais frutos brotando em nós, com certeza levaríamos muitos a pensar em continuar vivendo. Sim, continuar vivendo eternamente. Muitos, ou pelo menos alguns, vão querer a sensação aprazível de terem dentro de si uma fonte de água saltando para a eternidade.Sabemos que, em Cristo, é viável que coisas boas brotem a partir de nós. Isto é viver produzindo. O resto, sejam cem ou vinte e dois anos, é só morrer!

NÃO BASTA - POR PAULO CILAS

Não basta ser igreja! A palavra igreja no seu original grego referia-se a todo ajuntamento, reunião do povo para determinado fim. Umas cinco vezes, pelo menos, o termo foi usado no Novo Testamento sem ter a mínima relação com a Igreja de Jesus.
Mas também não basta ser uma igreja de um Jesus qualquer. O nome Jesus, uma forma grega de Yeshua no hebraico, era muito comum . Muitos “Jesus” existiam! É necessário então, ser Igreja de Jesus, o Cristo!
Todavia, não basta seguir a qualquer cristo. Somos alertados quanto aos falsos cristos (messias a partir do hebraico - que quer dizer ungido) que vieram e virão a surgir. A eles são atribuídos poderes e milagres, sinais e maravilhas. Ora, como saber a que “cristo” seguir? Jesus nos alerta para que quando disserem : “Eis o cristo ali ou acolá” não podemos dar ouvidos.
Por fim, não basta ser uma igreja qualquer, muito menos de um qualquer “Jesus”. E nem seguirmos os muitos “cristos”. O que basta é sabermos que Ele é muito mais! Ele é o Deus Conosco, o Príncipe da Paz, o Pai da Eternidade. Percebemos isto em nós? O Seu caráter está infundido em nós? Sentimo-nos necessitados Dele? Entendemos Seu amor? Se a resposta é sim, isto nos basta!!!
PS. Não basta está arrolado no rol de membros de uma igreja local. Basta está inscrito no LIVRO DA VIDA DO CORDEIRO!

sexta-feira, 31 de julho de 2009

O SENHOR DO LADO DE FORA - POR PAULO CILAS

Há algum tempo fiquei curioso quanto à expressão "voz do que clama do deserto" referente a João Batista. De súbito, me ocorreu que não era ele, João, que clamava. Ele era tão somente a voz de quem clamava. E quem clamava? Deus!!!Fora da cidade, fora do templo clamava, pois não havia "lugar para Sua Presença" com os Caifás e Anás religiosos e corruptos dominando os cultos, alimentando hipocrisias.Mais tarde, encontramos uma cena triste e, muitas vezes, disfarçada, dada à nossa interpretação errada da passagem bíblica (pelo menos, minha interpretação errada, que via ali um convite ao pecador não crente para que o mesmo aceitasse a Jesus). Refiro-me à cena descrita por João, apóstolo, na carta de Jesus endereçada aos de Laodicéia: "eis que estou à porta e bato. Aquele que ouvir minha voz e abrir a porta Eu entrarei..."! Ora, a situação não é outra se não Jesus, O Senhor da Igreja, pedindo para entrar na igreja. E é fácil perceber porque Ele está do lado de fora. Leia e veja em Ap. 3: 14-20 que a igreja estava morna, causando ânsia de vômito e, agarrada às suas riquezas e capacidades, não percebia o quão miserável era.O Senhor fora do templo, O Senhor fora da igreja! Será que temos a certeza de que o Reino está dentro de nós?Nota. Ouvindo Ariovaldo Ramos tive melhor compreensão sobre o tema.

GRAÇA QUE NOS EMPAREDA - POR PAULO CILAS



Conta Philip Yancey que, chegando a uma reunião de escritores cristãos, um assunto já estava em debate: Qual a maior contribuição prática do Cristianismo ao mundo? Bem informalmente, os debatedores constatavam que benfeitorias sociais, educacionais, médicas e outras emocionais e espirituais também eram realizadas por muitas outras religiões no mundo. Ao responder, Yancey foi direto: A Graça!De fato, todas as religiões apresentam algum tipo de salvação sempre baseada no auto-sacrifício, reencarnação, mérito e purgatório, etc...Mas, triste mesmo é a constatação de que a Graça não é compreendida e por isso mesmo não vivida; e o pior, ela não é aceita no meio dos que dizem seguir seu Autor. Em alguns casos ela soa como uma ameaça à boa fé. Mas, por que? Porque a Graça não consegue ser entendida em sua plenitude?Penso que, no confronto com a Lei, ela é muito mais contundente. Na Graça, não basta não matar, pois ela me revela o quanto sou mau em odiar. Ela me coloca em pé de igualdade com um assassino. E isto? Ah! Isto é injusto, ora. Então, ainda que meio sem querer, eu a renego.E o mérito? Vivemos a era da concorrência, da mídia. Propagandas de escolas afirmam que nelas só estudam as melhores cabeças ou os que querem ter um futuro brilhante. E, no mercado, os melhores são logo escolhidos e usados. Na igreja humana quanto maior e luxuoso o prédio, quanto mais "visões e unções" e o maior número de seguidores, tem-se estabelecida a melhor, a mais, mais dentre todas.Entretanto, a Graça joga tudo isto por terra. Nela estávamos todos encerrados debaixo da desobediência. Todos éramos, sem ela, miseráveis, pobres , cegos e nus. E sem ela permanecemos assim. Méritos, justiça própria, aparências, obras... Nada disso subsiste. Nada pode ser apresentado diante de Deus como coisa de valor. Pois tudo estava condenado.Alguns, para não dizer muitos, alegam que quando se prega muito sobre Graça há uma corrida desenfreada para o pecado. O entendimento é que a pessoa se torna mais pecadora a partir da Graça. Muitas vezes, isto não é dito de forma clara, mas está camuflado no "modus operandis" eclesiástico. Mas vejam só! Pela Graça é a única maneira possível do homem ser salvo."O homem não é pecador porque peca. Ele peca por ser pecador".Estou então emparedado pela Graça. Sendo o único instrumento de salvação, sua eficácia só se dá em meio a uma confissão genuína. Não aceita aparência, mas me expõe como verdadeiramente sou, quebrando minha altivez . Devo fazer o melhor sem esperar recompensa, pois se o fizer nem "servo inútil" serei. Torno-me só inútil.Então, viver pelas várias leis criando novas fórmulas e regras disfarçadas de coisas de Deus é mais cômodo. A Graça constrange muito!
Postado por Pr. Paulo Cilas às 06:06

sexta-feira, 24 de julho de 2009

MACHADO QUE SE PERDE, VIDA QUE RESSURGE - POR PAULO CILAS

A narrativa de 2 reis 6: 1-7 poderia ser vista tão somente como mais um milagre de Deus através de um servo seu. Contudo, as páginas do texto sagrado, ao retratar a trajetória humana, expõem aspectos dos mais agudos e fundamentais aos mais comezinhos e diários. E em todos, absolutamente todos, temos ensinamentos riquíssimos.
Pois bem, encontramos nesta passagem uma situação comum a todos nós: querer melhorar de vida, a maneira de viver. "O lugar que moramos é pequeno demais, permita que façamos uma casa maior". Os filhos dos profetas – aprendizes do ofício profético – queriam tão somente uma casa mais confortável, quem sabe com maior privacidade. Enfim, algo muito prosaico. Mas, ao cortar uma árvore, o machado de um deles caiu nas águas do Jordão. Ferramenta cara e rara naqueles tempos, tal perda fez com que o moço empalidecesse de susto, pois, na verdade, o machado não lhe pertencia.
E agora? A ação a seguir é de uma simplicidade fenomenal. Eliseu toma um pequeno pedaço de pau, um galho talvez, e, perguntando ao moço em aflição qual o lugar exato onde caíra o machado, ali o lançou e o machado veio à tona. “Estenda a mão e pegue-o", foi a ordem seguinte.
Algumas vezes, perdemos o machado também. Nos nossos sonhos e anseios, necessidades prementes ou secundárias, nos vazios e cansaços, sentimos que nossa vida parou. Ou a continuação dela se dá sob o signo da desesperança, da falta de perspectiva. Ou ainda, a vida continua, mas estimulada por valores e ética empobrecidos. Não vivemos, por hora só existimos.
Perdemos a alma. A nossa alma vivente caiu no rio.
E a solução é: primeiro, identificar o lugar exato da queda. E isto não é fácil, dada nossa dificuldade de encarar as dores e decepções vividas, e, mais dificuldade ainda, quando somos os causadores de nossas tragédias. Reconhecer erros sem culpar outros é tarefa penosa demais para nós.
Conseguindo identificar o lugar da queda, o segundo passo é estender a mão para pegar o machado – alma, vida. E, nesta hora, podemos estar desanimados demais, descrentes mais ainda. Pior, passamos a nos alimentar da nossa miséria. Envergados diante dos descaminhos, esperamos que o machado não somente bóie, mas que também venha voando para nossas mãos.
Mas, o milagre parou no momento em que as águas devolveram a ferramenta. Coube ao moço estender a mão e a tomar.
Da mesma forma, o Senhor age conosco. Fornece-nos, miraculosamente, o instrumento perdido e, a partir daí, é conosco, pois não adianta ter alma e não querer a vida, ter a vida e não querer construir, não querer melhorar. Principalmente querer melhorar como gente.
Tomemos a nossa ferramenta nas mãos porque Deus, em Jesus Cristo, a fez ressurgir das profundezas e nos possibilitou ter vida, e vida em abundância.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A CRUZ DE CRISTO E A ESPIRITUALIDADE CRISTÃ - POR RICARDO BARBOSA

Tenho, nos últimos anos, refletido sobre a espiritualidade cristã. Minha preocupação está voltada para a apatia espiritual, a falta de integridade e coerência entre nossas convicções e a vida, a distância entre a teologia e a oração, e o chamado de Cristo para amar a Deus com a mente e o coração. Embora este tema tenha tomado outros rumos e provocado outros interesses, nem sempre fundamentados na Bíblia ou na longa tradição cristã, ele segue sendo um grande desafio para os cristãos do século 21. Para manter o foco numa espiritualidade cristã e bíblica, é preciso reconhecer a centralidade da cruz. A cruz de Cristo foi única no sentido de que representou uma escolha, um caminho que Jesus decidiu trilhar: o caminho da obediência ao Pai. A espiritualidade cristã requer obediência. Sabemos que no tempo de Jesus existiram muitas outras cruzes e muitos que foram crucificados nelas; alguns culpados, outros martirizados. No entanto, nenhuma delas pode ser comparada com a cruz de nosso Senhor em virtude daquilo que ela representou.Podemos considerar que a cruz de Cristo começa a ser carregada no episódio da tentação. Ali, o diabo propõe um caminho para Jesus ser o Messias. Um caminho que representou uma forma tentadora de ser o Messias. Transformar pedras em pães, saltar do alto do templo e ser amparado por anjos, e receber a autoridade política e financeira sobre os reinos e as nações. Se Jesus aceitasse a oferta do diabo, rapidamente teria uma multidão de admiradores, de gente faminta encontrando pão nas ruas e estradas, encantada com seu poder sobre os anjos e os seres celestiais e com seu governo mundial estabelecendo as novas regras políticas e econômicas. Seria o caminho mais rápido para implantar seu reino entre os homens.Porém, o caminho de Deus não era este. O reino que ele oferece precisa nascer primeiro dentro de cada um. As mudanças não acontecem de cima para baixo nem de fora para dentro. É um reino que vem como uma pequena semente e leva tempo para crescer. Não é imposto, é aceito. Não se estabelece pela força do poder, mas pelo coração e mente transformados. O rei deste reino não permanece assentado no seu trono, mas desce e se torna um servo. A cruz de Jesus não significou apenas o sofrimento final do seu ministério público. Ela representou uma escolha que o acompanhou por toda a sua vida e que culminou em seu sofrimento e morte. Quando Jesus nos chama para segui-lo, ele afirma que, se não tomarmos nossa cruz, não será possível ser seu discípulo. A razão para isto é clara. Se o caminho dele é o caminho do servo obediente, o nosso não pode ser diferente. Por isto, precisamos tomar nossa cruz, e ela deve representar também nossa escolha, que é a mesma que ele fez -- uma escolha pela renúncia e pela obediência ao Pai.O apóstolo Paulo entende o chamado de Jesus para tomar a cruz e segui-lo quando afirma: “Eu estou crucificado para o mundo e o mundo está crucificado para mim”. O caminho do mundo ensina: “Ame seus amigos e seja indiferente com os outros”. O caminho de Jesus diz: “Ame os inimigos e ore por eles”. No caminho do mundo ser o maior e o melhor é o mais importante. No caminho de Jesus o melhor é ser o menor e o servo de todos. Podemos achar que o caminho de Cristo é muito difícil, que amar os inimigos, orar pelos caluniadores, ser manso num mundo competitivo, humilde numa sociedade ambiciosa, não é só difícil -- é impossível. Concordo, por isto o chamado é para tomar a cruz. A cruz significa renúncia, sofrimento e morte.As opções estão diante de nós diariamente. Todos os dias somos levados ao monte da tentação. Todos os dias o diabo nos oferece suas ofertas e seu caminho, e Deus, pela sua palavra, nos revela seu caminho. Todos os dias temos de fazer nossas escolhas. Tomar nossa cruz é aceitar o caminho de Cristo, e neste caminho experimentamos uma espiritualidade verdadeira.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

PEGANDO CARONA - POR PAULO CILAS

Quantas vezes a vontade de escrever vem e encontra grande resistência das circunstâncias adversas que afetam tempo, saúde e até o raciocínio lógico, imprescindível para colocar pensamentos e palavras faladas em textos claros. Isto sem contar a ausência de um dom natural "pra coisa". Aí, lembro-me que tem gente falando e escrevendo coisas boas, com conteúdo. Gente que até quando dá voz às lamurias, medos e dúvidas consegue inspirar-me por sua transparência e humildade. Quantas reflexões ricas brotam.
Então não tenho dúvida. Vou pegando carona com esta gente boa de Deus, como diz Caio Fábio. Às vezes fico até enciumado. "Como essa gente pode expressar tão bem "? Para me elevar um pouquinho afirmo que penso igual. Tolices de menino! Mas no íntimo fica a satisfação de quem "tá indo junto" e em boa compainha. São mestres sensatos como Eugene Peterson - recomendo tudo que ele escreve-, Brennan Manning - humildade e poesia de um maltrapilho - os Ricardo: Gondim, Agreste e Barbosa - pastores brasileiros de carne , osso e almas derramadas. Há ainda Ed Rene Kivitz - não sei como tanta cultura geral, bíblica e social cabe dentro de alguém tão simples. Outros nomes estão aqui no blog. Igualmente valorosos.
Pegar carona! Pegue carona na oração dos outros quando parecer que você não consegue orar sozinho. Pegue carona na letra e melodia daquela música que parece que foi composta com Deus ao piano. Ou tome coragem ao ouvir outra como eu ouvir: estava na hora do culto e eu arrasado por um desânimo. Coloquei Vitorino Silva para cantar para mim - "todo poder foi dado a Ele, Jesus. E eu posso ver Jesus pisando o mais profundo do inferno e as paredes serem sacudidas com seu poder. E Ele face a face com o enganador resplandeceu a Luz de Deus e a cabeça da serpente Ele esmagou"!! Fui de carona com Vitorino Silva para o culto.
Sei que não devo acomodar-me. Tenho minha própria viagem,uma estrada. Mas, quando meu carro enguiça ...

AS OPÇÕES DA MINHA ALMA - POR RICARDO GONDIM

Não pretendo fazer teologia com verdades “puras”, abstraídas da Bíblia a partir do pressuposto de que uma correta dissecação do texto garante a verdade. Preocupo-me com problemas éticos e práticos da pastoral. Lido com pessoas reais, que vivem problemas reais, que fazem perguntas reais.
Não pretendo fazer teologia a partir de afirmações teóricas descoladas das questões “duras” que intrigam a minha alma. Quero ser realista. Entendo por realismo, o esforço de aproximar coração e mente da existência. Acredito que o Logos, o Verbo, se fez carne e habitou entre nós; vimos, tocamos e cheiramos a verdade. O conhecimento do Logos não se restringe à racionalidade, mas transborda para o compromisso, para a comunhão, para a solidariedade e para a busca da justiça. A obediência da fé tem mais possibilidade de compreender os mistérios de Deus que o estéril exercício da racionalidade.
Não pretendo fazer teologia a partir da letra do texto, que mata. Entendo que certas verdades só são captadas pelo espírito. É preciso nascer, nadar, voar, absorver-se, divagar no Espírito para fragilmente intuir o Mistério. As cataratas espirituais caem dos olhos; as vestes puídas são despidas; os vícios categoriais, abandonados, mas só molhamos o calcanhar no rio eterno.
Não pretendo fazer teologia a partir do sucesso. Entendo que o carreirismo eclesiástico deságua em perversidade. Sacerdotes mataram o Nazareno. Teólogos acenderam fogueiras na Idade Média. Presbíteros sustentaram o aparthaid sul-africano. A verdade não se reduz à mecânica, ao ato de funcionar. Prefiro ostracismo ao aplauso dos pelegos da fé; exílio, aos holofotes do espetáculo religioso; abandono, ao adesismo interesseiro.
Não pretendo fazer teologia a partir das lógicas ensimesmadas. Reconheço que apesar de pequenos percalços, levo uma vida bem confortável. Procuro não permitir que vantagens, amparos, privilégios, me roubem da compaixão. Admito que é muito fácil abstrair sobre o sofrimento universal de dentro de zonas de segurança. Entendo o grande projeto de Deus para a humanidade: trocar corações de pedra por corações de carne. Assim, preciso molhar meus textos com lágrimas, impregnar meus discursos com misericórdia, calcar minha história com ternura.
Caminho ao sabor do vento. Navego, impreciso. Trabalho constrangido pelo amor. Vivo pela graça. Espero joeirar da fragilidade a bem-aventurança da mansidão. E com ela herdar a terra.
Soli Deo Gloria.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

TALVEZ: PALAVRA FORA DE MODA - POR ELBEM CESAR

Os neopentecostais aposentaram o advérbio “talvez”. E muitos tradicionais estão fazendo o mesmo. É claro que as promessas de Deus são para valer. A questão é que as promessas de Deus são condicionais e nunca se sabe com certeza absoluta se a pessoa que deseja se apropriar de algum favor divino satisfez plenamente a condição imposta. Deus promete perdão e purificação “se confessarmos os nossos pecados” (1 Jo 1.9). Mesmo que o penitente diga que fez a confissão exigida, alguma coisa ainda fica no ar. E se a confissão dele for de boca para fora? Certamente não será perdoado nem purificado. Resta ainda a questão da soberania de Deus, que precisa ser respeitada. Não posso prometer cura a todo doente que, em nome de Jesus, pede para ser curado, porque “havia muitos leprosos em Israel no tempo de Eliseu, o profeta; todavia, nenhum deles foi purificado -- somente Naamã, o sírio” (Lc 4.27).Promessas não cumpridas são uma desmoralização para o evangelho. Promessas irresponsáveis, mirabolantes, sensacionalistas e vulgares são a escola que forma céticos e ateus, e são muitos os que foram diplomados por ela. Quais são os culpados?É muito prudente recolocar a palavra “talvez” em nosso vocabulário. Isso não significa falta de fé. Ao contrário, significa humildade e submissão.A frequência do vocábulo em questão nas Escrituras Sagradas é impressionante.Daniel disse a Nabucodonosor, rei de Babilônia: “Renuncia a teus pecados [...] e à tua maldade e tem compaixão dos necessitados. Talvez, então, continues a viver em paz” (Dn 4.27).O capitão do navio prestes a naufragar entrou na cabine de Jonas e lhe disse: “Levante-se e clame ao seu deus! Talvez ele tenha piedade de nós e não morramos” (Jn 1.6).Amós apelou a Israel: “Odeiem o mal, amem o bem; estabeleçam a justiça nos tribunais. Talvez o Senhor, o Deus dos Exércitos, tenha misericórdia do remanescente de José” (Am 5.15).Sofonias fez a mesma exortação de Amós: “Busquem a justiça, busquem a humildade; talvez vocês tenham abrigo no dia da ira do Senhor” (Sf 2.3).Pedro advertiu a Simão, o Mago, aquele que pretendeu comprar com dinheiro o poder de impor as mãos sobre os outros para receberem o Espírito Santo: “Arrependa-se dessa maldade e ore ao Senhor. Talvez ele lhe perdoe tal pensamento do seu coração” (At 8.22).Vamos ter mais respeito com o santo nome de Deus e usar mais o formidável “talvez” em nossas conversas, em nossos atendimentos e em nossas pregações!Nota1. Textos retirados da Nova Versão Internacional.•

quarta-feira, 17 de junho de 2009

SOBRE O INIMIGO- POR RICARDO GONDIM

Caramba, como se fala no diabo! Fico impressionado como ele se tornou necessário. O diabo suga a fé, derruba crente, se infiltra em poderosas redes de televisão, envia pragas, fura pneu de carro, provoca terremotos, conhece os limites dos municípios e domina territórios. Compete e ganha de Deus. É diabo para cá e para lá o tempo todo. Se alguém está triste, advinha quem mandou a tristeza. Se alguém duvida, advinha quem mandou a dúvida. Se alguém adoece, advinha quem mandou a enfermidade. Arre! Chega! Será que ninguém vai assumir o que faz? Fica fácil culpá-lo já que o mundo inteiro está controlado, guiado, dominado, manipulado e organizado por Satã. Mas o Bicho merece o estatus de espantalho, Judas, bode expiatório? Até quando os humanos vão projetar nele suas mazelas?Dá para compreender tanta importância. Como se levantaria dinheiro nas igrejas se o Capeta não fosse a estrela do show da fé? Como televangelistas inculcariam pavor nas pessoas se o Coisa-Ruim não fosse tão medonho? Como as poderosas multinacionais da fé subsidiariam seus projetos se o Demo não adquirisse tanta força? Confesso. Tenho medo de uma religião em que o mal se torna o pivô da espiritualidade. Fico apreensivo com uma fé que não pode prescindir de ameaças e arredio com uma ética constrangida pela possibilidade de Satanás ter direitos legais para arrasar as pessoas que erram.
Não discuto a sua existência. Fico apenas suspeitoso com tanta badalação. Eu já não gostava dele, agora não aguento mais ouvir falar na Peste. Por mim, Belzebu não receberia nenhum jabá. Eu não permito que ele dê o tom do meu culto a Deus; não aceito que seja a minha motivação para agir. Enfim, não deixo que ele tome o lugar de Jesus.
Soli Deo Gloria

terça-feira, 2 de junho de 2009

A PROVIDÊNCIA DE DEUS E A ORAÇÃO DE SEUS SERVOS - POR REV. HERMISTEN MAIA

Jesus nos ensinou a orar: “… Faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt 6.10). A oração não é uma tentativa de mudar a vontade de Deus, mas sim a manifestação sincera do nosso desejo de submeter-Lhe os nossos projetos, aspirações, sonhos e necessidades. A oração sincera se caracterizará pelo intenso desejo de submeter nossos desejos à vontade de Deus. Esta submissão não é algo simplesmente aprendido pela razão, embora mesmo racionalmente temos argumentos para assim proceder, pelo fato de sabermos que Deus é sábio, bondoso e onisciente. “Somente o Espírito pode capacitar-nos a subordinar todos os nossos desejos à glória divina”. A submissão a Deus é um aprendizado da fé, através de nossa comunhão com Ele.
Quando pedimos que Deus faça a Sua vontade, o fazemos não resignadamente, como se não tivesse jeito mesmo, ou como se Deus fosse o nosso inimigo que nos venceu e que agora só resta nos submeter humilhantemente… Não! A nossa oração é feita com amor e confiança, certos de que a vontade de Deus é sempre a melhor, de que ela sempre é boa, agradável e perfeita (Rm 12.2); por isso, temos prazer em cumpri-la, conforme bem expressaram Davi e Paulo, respectivamente: “Agrada-me fazer a tua vontade, ó Deus meu; dentro em meu coração está a tua lei” (Sl 40.8). “Não servindo à vista, como para agradar a homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus” (Ef 6.6). Somente um coração que tem dentro de si a Palavra, pode sentir prazer na vontade de Deus e, se alegrar na manifestação do Seu poder.
Ao orarmos sinceramente, conforme nos ensinam as Escrituras, estamos submetendo a nossa vontade a Deus; isto significa que não pretendemos ensinar a Deus, nem mudar a Sua vontade; antes, nos colocamos diante dEle dizendo: Eu creio que a Tua vontade é a melhor para a minha vida, cumpre em mim todo o Teu propósito. Orar é entregar confiantemente o nosso futuro a Deus a fim de que Ele concretize Sua eterna e santa vontade em nós. A oração revela o nosso desejo de que a vontade de Deus se realize.
João Calvino (1509-1564), comentando esta petição, diz:
“Com esta prece somos induzidos à negação de nós mesmos, para que Deus nos reja conforme o Seu arbítrio. Nem somente isto, mas também que, a nada reduzidos a mente e o coração nossos, crie Deus em nós mente nova e novo coração, para que em nós não sintamos qualquer frêmito de desejo que a pura anuência para com a Sua vontade. Em suma, que não queiramos nós próprios algo de nós mesmos; pelo contrário, que Seu Espírito nos governe o coração, para que, ensinando-nos Ele interiormente, aprendamos a amar as cousas que lhe aprazem, a, porém, odiar as que Lhe desagradam. De onde também isto se segue: que todos e quantos sentimos à vontade se Lhe opõem, a esses renda-os e vãos e írritos.”

A Oração do Senhor nos ensina a pedir a Deus que realize a Sua vontade aqui na terra como é feita no céu. Oramos para que a vida na terra se aproxime o máximo possível a do céu, onde os anjos cumprem perfeitamente a vontade de Deus (Sl 103.21).
A vinda do reino (Mt 6.10) é o resultado lógico do cumprimento da vontade de Deus. Quando assim oramos, estamos seguros de que Deus age sempre em a) Sabedoria; por isso confiamos nos Seus propósitos; b) Poder; sabemos que Ele é poderoso para cumprir perfeita e totalmente os Seus propósitos; c) Fidelidade; Deus é fiel a Si mesmo e por isso, Se revela fiel a nós através de Suas promessas; d) Amor; a Sua vontade é sempre amorosa; o amor de Deus é aquele que se sacrifica pelo Seu povo.
Finalizando a análise deste princípio, devemos mencionar um outro: A submissão. A submissão deve reger as nossas orações. Esta atitude vemos plenamente exemplificada em Cristo, em Sua oração proferida próxima ao Seu martírio: “Meu Pai: Se possível, passa de mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e, sim, como tu queres” (Mt 26.39). O ministério terreno de Cristo foi uma manifestação constante da Sua obediência desde a Sua encarnação, passando por todos os desafios inerentes à Sua missão, até a Sua auto-entrega na cruz em favor do Seu povo (Vd. Fp 2.5-8; Hb 5.8).
A oração está relacionada com a Providência de Deus. Se por um lado, nós não podemos delimitar a ação de Deus às nossas orações, por outro, devemos estar atentos ao fato de que Deus nos abriu a porta da oração a fim de exercitarmos a nossa fé em paciente submissão. Entendemos que as nossas orações quando feitas por um motivo justo, através de Cristo e, partindo de um coração sincero, fazem parte da execução do plano de Deus. “Quando Deus nos dá aquilo que pedimos, é como se essas coisas tivessem nelas a estampa de nossas orações!”
Portanto, não devemos nem podemos pedir qualquer coisa a Deus contrária à vontade de Jesus Cristo, visto que as nossas orações são feitas em Seu nome. “Solicitar algo a Deus, em nome de Cristo, quer dizer solicitar-lhe algo em harmonia com a natureza de Cristo! Pedir algo em nome de Cristo, a Deus Pai, é como se o próprio Cristo estivesse formulando a petição. Só podemos pedir a Deus aquilo que Cristo pediria. Pedir em nome de Cristo, pois, significa deixar de lado nossa vontade própria, aceitando a vontade do Senhor!
Quando oramos, estamos exercitando o privilégio que Deus nos concedeu, amparados na Sua Palavra que nos mostra as Suas promessas. A nossa oração é dirigida ao Pai, sabendo que Ele é um Pai onisciente e providente: por isso, não pretendemos e, de fato não podemos mudar a vontade de Deus. E, francamente, ainda que pudéssemos, ousaríamos fazê-lo? Será que faríamos algo melhor? Se você por um instante sequer titubear diante desta, permita-me, ridícula questão, é porque você ainda não conhece o Deus da Palavra!
Nesta mesma linha de raciocínio, escreveu Packer:
“O reconhecimento do fato da soberania de Deus é a base de [nossas] orações. Na oração, o cristão solicita coisas e agradece por elas. Por quê? Porque reconhece que Deus é a origem de todo bem que já possui e de todo bem que espera no futuro. Essa é a filosofia fundamental da oração cristã. A oração não é uma tentativa para forçar a mão de Deus, mas um humilde reconhecimento de incapacidade e dependência. Quando nos pomos de joelhos, sabemos que não somos nós que controlamos o mundo; não estando em nosso poder, portanto, atender nossas necessidades pelos nossos próprios esforços independentes; todas as coisas boas que desejamos para nós mesmos e para os outros devem ser procuradas em Deus; e se elas vierem, virão como dádivas de Suas mãos. (…) Por conseguinte, o que na realidade fazemos, cada vez que oramos, é confessar nossa própria impotência e a soberania de Deus. Dessa maneira, o próprio fato de um crente orar é uma prova positiva de que crê na soberania do seu Deus.”
Curiosamente, Platão (427-347 a.C.), um filósofo pagão, com discernimento correto, entendia que um dos males de sua época era a corrosão da religião praticada por supostos sacerdotes e profetas - que ele chama de mendigos e adivinhos -, os quais exploravam a credulidade das pessoas, especialmente das ricas. Dentro do quadro descrito, uma das fórmulas usadas por esses líderes religiosos, era fazer as pessoas crerem que poderiam mudar a vontade dos deuses mediante a oferta de sacrifícios ou, através de determinados encantamentos; os deuses seriam portanto limitados e aéticos, sem padrão de moral, sendo guiados pelas seduções humanas:

“Mendigos e adivinhos vão às portas dos ricos tentar persuadi-los de que têm o poder, outorgado pelos deuses devido a sacrifícios e encantamentos, de curar por meio de prazeres e festas, com sacrifícios, qualquer crime cometido pelo próprio ou pelos seus antepassados, e, por outro lado, se se quiser fazer mal a um inimigo, mediante pequena despesa, prejudicarão com igual facilidade justo e injusto, persuadindo os deuses a serem seus servidores - dizem eles - graças a tais ou quais inovações e feitiçarias. Para todas estas pretensões, invocam os deuses como testemunhas, uns sobre o vício, garantindo facilidades (…). Outros, para mostrar como os deuses são influenciados pelos homens, invocam o testemunho de Homero, pois também ele disse: ‘Flexíveis até os deuses o são. Com as suas preces, por meio de sacrifícios, votos aprazíveis, libações, gordura de vítimas, os homens tornam-nos propícios, quando algum saiu do seu caminho e errou’ (Ilíada IX.497-501).

Meus irmãos, este quadro pode parecer estranho, mas na realidade, muitas pessoas ainda crêem assim ou, pelo menos se comportam como se Deus fosse movido de um lado para o outro conforme as nossas “seduções espirituais”: longas orações, peregrinações, sacrifícios, abstinências, louvores exaltados, entre outros recursos. Este não é o Deus das Escrituras. O nosso Deus dirige todas as coisas com sabedoria, justiça e amor; é a Ele a Quem oramos: “seja feita a Tua Vontade!”
A oração é um testemunho solene de nossa confiança no cuidado paternal de Deus. A Palavra nos estimula a lançar sobre Deus e a Sua promessa toda a nossa confiança. Jesus Cristo nos instrui: “Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas cousas vos serão acrescentadas. Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal” (Mt 6.33-34). “Não se vendem dois pardais por um asse? e nenhum deles cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai. E quanto a vós outros, até os cabelos todos da cabeça estão contados. Não temais pois! Bem mais valeis vós do que muitos pardais” (Mt 10.29-31).
O nosso Pai conhece os nossos corações; Ele sabe as nossas motivações e intenções. As pessoas podem nos julgar mal como também nós cometemos este mesmo equívoco; isto ocorre amiúde ou porque não fomos claros como gostaríamos, ou porque de fato houve má vontade; ou seja, houve algum ruído na comunicação. No entanto, o nosso Pai, nos conhece perfeitamente; Ele vê em secreto os segredos dos nossos corações (Mt 6.6). João testifica a respeito de Jesus Cristo: “E não precisava de que alguém lhe desse testemunho a respeito do homem, porque ele mesmo sabia o que era a natureza humana” (Jo 2.25).
Quando oramos, nós buscamos o Pai, não o homem (Mt 6.5,6). Este é o sentido genuíno da oração. Não estamos, através da oração, em busca de recompensa humanas, tais como: o aplauso, um alto conceito a respeito de nossa devoção e piedade; não. Apesar desta “recompensa” ser geralmente mais imediata, nós não a buscamos… Pelo contrário, oramos ao Pai para de fato, falar com Ele, colocando diante de Seu trono de graça as nossas necessidades… E neste procedimento, jamais devemos nos esquecer de que Ele sabe todas as coisas.
Mesmo sem conseguir entender perfeitamente a extensão deste maravilhoso mistério, não podemos deixar de utilizar a oração, um privilégio que Deus graciosamente nos concedeu, de podermos falar com Ele e, de exercitar a nossa fé na Sua soberana providência. (1Sm 1.9-20; Sl 6.9; Pv 15.29; Mt 26.41; Lc 1.13; 1Ts 5.17; Tg 4.2,3; 1Jo 5.13-15). “É pela fé que tomamos posse de Sua providência invisível”, conclui Calvino. Deus sabe das nossas necessidades. O saber de Deus não é apenas intelectual: Deus sabe e por isso cuida (Mt 6.8). Ele não dorme, antes, sabe do que necessitamos antes mesmo que tenhamos consciência da nossas necessidades: A Bíblia também nos ensina que Deus nem sempre nos dá aquilo que pedimos; entretanto, sempre nos dá aquilo de que necessitamos de fato e de verdade, mesmo que nem ainda tenha penetrado em nosso coração a realidade da carência… A nossa demorada consciência de nossas próprias carências não escapa à Providência de Deus, nem à Sua graciosa provisão.
A Palavra de Deus declara isto. Os salmistas, inspirados por Deus, testificam: “Os olhos do Senhor repousam sobre os justos, e os seus ouvidos estão abertos ao seu clamor” (Sl 34.15). “Ele não permitirá que os teus pés vacilem: não dormitará aquele que te guarda. É certo que não dormita nem dorme o guarda de Israel” (Sl 121.3-4). “Aí habitou a tua grei: em tua bondade, fizeste provisão para os necessitados” (Sl 68.10). E Deus mesmo promete: “E será que antes que clamem, eu responderei; estando eles ainda falando, eu os ouvirei” (Is 65.24).
A ação de Deus na História não é de forma imediatista ou apenas para resolver problemas isolados. Deus age de forma sábia, conforme o Seu Santo Conselho, objetivando a Sua Glória na execução do Seu plano. O Plano de Deus e o Seu governo são eternos e eficazes. Davi e Paulo declaram esta compreensão, respectivamente: “Os teus olhos me viram a substância ainda informe, e no teu livro foram escritos todos os meus dias, cada um deles escrito e determinado, quando nem um deles havia ainda” (Sl 139.16). “Quando, porém, ao que me separou antes de eu nascer e me chamou pela sua graça…” (Gl 1.15).
O próprio Deus, reivindica o Seu governo quando vocaciona o profeta Jeremias: “Antes que eu te formasse no ventre materno, eu te conheci, e antes que saísses da madre, te consagrei e te constituí profeta às nações” (Jr 1.5).
Deus, o nosso Pai, cuida de cada um de nós como se fôssemos o único que Ele teria para cuidar; Ele cuida “pessoalmente” de nós. As nossas orações são o testemunho desta certeza. O Deus que preservou a Elias, enviando os corvos para lhe levarem alimento (1Rs 17.1-6), é o mesmo que é o nosso Pai onisciente e providente. Portanto, podemos fazer eco ao testemunho de fé e vida de Davi e de Paulo: “O Senhor, tenho-o sempre à minha presença; estando Ele à minha direita não serei abalado” (Sl 16.8). “Não andeis ansiosos de cousa alguma; em tudo, porém, sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas petições, pela oração e pela súplica, com ações de graça” (Fp 4.6).
O melhor antídoto contra a ansiedade é a oração sincera e confiante, através da qual expomos a Deus as nossas dúvidas, temores e confiança. Portanto, orar é exercitar a nossa confiança no Deus da Providência, sabendo que nada nos faltará, porque Ele é o nosso Pai.
Calvino, relacionando as nossas orações ao cuidado providente de Deus, escreve:
“Para incitar os verdadeiros crentes a uma mais profunda solicitude à oração, Ele promete que, o que propusera fazer movido por Seu próprio beneplácito, Ele concederia em resposta a seus pedidos. Tampouco existe alguma inconsistência ente estas duas verdades, a saber: que Deus preserva a Igreja no exercício de sua soberana mercê, e que Ele a preserva em resposta às orações de Seu povo. Pois, visto que suas orações se acham conectadas às promessas graciosas, o efeito daquelas depende inteiramente destas.”[

quinta-feira, 14 de maio de 2009

A HUMILDADE- POR RICARDO GONDIM

Sobre a humildade, concordo com André Comte-Sponville: “Não é a ignorância do que somos, mas, ao contrário, conhecimento, ou reconhecimento de tudo o que não somos”. É a admissão de que cheguei onde estou sem gabar-me: “sou o que sou pela graça”.
Quando penso em humildade, acompanho Dwight Moody: “O homem pode demonstrar um falso amor, uma falsa fé, uma falsa esperança e outras graças, mas jamais poderá simular humildade”. Também concordo com Stanley Jones: “A essência do divino é a humildade. O primeiro passo para encontrar a Deus é destruir nosso orgulho”.
A humildade não sobrevive sem que se aniquilem as falsas onipotências. O petulante não admite fragilidades, não reconhece limites, não aceita inadequações. O soberbo se embrutece porque é insaciável. Apropria-se da pergunta do poeta: “Por que não é infinito o poder humano, como o desejo?” Dionisíaco, atropela quem estiver na frente. Odeia ser frustrado. Spinoza dizia que “a humildade é uma tristeza nascida do fato de o homem considerar sua impotência ou sua fraqueza”. Nietzsche bateu o martelo: “Conheço-me demais para me glorificar do que quer que seja”. E Comte-Sponville conclui: “O que é mais ridículo do que bancar o super-homem?... A humildade é o ateísmo na primeira pessoa: o homem humilde é ateu de si, como o não-crente o é de Deus”.
A humildade e a gratidão necessitam uma da outra. O humilde sabe que não se fez; não é o self-made man, que se recusa a reconhecer os que lhe ajudaram nos primeiros degraus. Sente-se devedor dos pais que se sacrificaram para que estudasse, dos professores que lhe incutiram valores, dos amigos que nunca censuraram na vergonha, dos poetas que traduziram beleza, dos profetas que lhe falaram em nome de Deus. Nos solilóquios, repete: “Não sou a causa de mim mesmo; vejo nos outros a raiz da minha alegria; celebro o meu presente como um dom".
A humildade é esvaziamento. O prepotente não consegue amar. Só quem abre mão dos controles sabe deixar-se invadir pela compaixão. Simone Weil afirmou que “o amor consente tudo e só comanda os que consentem em ser comandados”. Amor é renúncia. Não existe a possibilidade de coerção e amor se misturarem. O pretensioso é inflexível, impaciente e estúpido. O humilde recua, na recusa de exercer força, poder, violência.
A humildade é demasiadamente discreta. Se pretendo, um dia, ser humilde ninguém pode perceber. Mas, espero aprender a não cobiçar a divindade.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Entre peregrinos e turistas-por Ricardo Agreste

Existe uma estreita relação entre a jornada de um cristão e a experiência de um peregrino.

Todos estes viveram pela fé, e morreram sem receber o que tinha sido prometido; viram-no de longe e de longe o saudaram, reconhecendo que eram estrangeiros e peregrinos na terra. Hebreus 11:13Recentemente fui apresentado aos escritos e idéias de Zygmunt Bauman, um sociólogo polonês. No entanto, o que a princípio parecia ser apenas mais uma descoberta acadêmica, transformou-se num importante insight para minha compreensão pessoal e pastoral de uma das maiores barreiras impostas pela nossa cultura contemporânea no desenvolvimento de uma espiritualidade biblicamente consistente e sadia.Dentre as imagens utilizadas por Bauman para representar o homem e a mulher no mundo contemporâneo, chamou-me a atenção a imagem do “turista”. Turista é aquele indivíduo que visita muitos lugares, mas não pertence a nenhum deles. Às vezes fica extasiado com aquilo que vê, às vezes desdenha por ter em sua mente um grande quadro comparativo de lugares e situações. Seja qual for seu sentimento, não pretende se comprometer com nada à sua volta. Ele está apenas de passagem. Sua maior motivação está vinculada à descoberta de novos lugares e à vivência de novas experiências. Mas, num contraponto com a imagem do turista, Bauman apresenta a imagem do peregrino. O peregrino é uma espécie em extinção em nossa cultura contemporânea. Diferentemente do turista, o peregrino não está envolvido numa aventura de entretenimento, mas numa jornada que tem um início, um meio e um fim. Algo o moveu a iniciar a jornada, e ele percebe que ao longo dela existe uma missão a ser vivenciada e a realidade última se encontra no seu final. Todos estes pontos de referência são de grande importância e, portanto, tratados com grande reverência por parte do peregrino. Interessante que não poucas vezes na história da espiritualidade cristã os discípulos de Cristo são chamados e comparados a peregrinos. Existe uma estreita relação entre a jornada de um cristão e a experiência de um peregrino. Ambas possuem alguns elementos em comum: a consciência de que a realidade última está ainda por vir, a sensibilidade de que o caminho que trilham pertence ao processo da descoberta e do preparo de si mesmo para esta realidade final e, por fim, o senso de missão para com os lugares e pessoas por onde passam na direção do lugar almejado.No entanto, observando o auditório de muitas de nossas igrejas na atualidade, não será difícil constatar a presença massiva de pessoas mais parecidas com turistas do que com peregrinos. Eles estão ali para usufruir do espaço, degustar das informações e, principalmente, experimentar de um ambiente ou clima. Tão logo se sintam saciados com o que é oferecido e com a forma como as coisas acontecem, são tomados pelo tédio e passam a ser impulsionados a se moverem na direção de um novo lugar, de novas informações e de novas experiências.Como conseqüência disso, é triste constatar que algumas de nossas igrejas se tornaram “centro turísticos” com diferentes elementos de fascinação. Em algumas delas a atração principal é o famoso pregador com seu poder de reflexão, em outras é o momento de adoração com seu poder de arrebatamento coletivo e em outras é o seu momento de oração com seu poder de convencer Deus a agir e, até mesmo, de coagi-lo a mudar de idéia em algumas situações. Diferentes atrações emergem em diferentes lugares, mas as citadas são suficientes para exemplificar o problema que temos diante de nós.O que muitos cristãos não se dão conta é da completa inviabilidade de desenvolvermos uma espiritualidade biblicamente consistente e sadia nesta cultura gerada pelas demandas dos turistas. Por que? Deixe-me apontar apenas algumas razões para incentivá-lo a refletir mais sobre o assunto:1. Enquanto turistas estão comprometidos apenas com o seu próprio prazer e seu insaciável desejo por entretenimento, peregrinos estão comprometidos com uma jornada na qual possuem uma vocação a ser exercida ao longo do caminho a ser percorrido. 2. Enquanto turistas consomem lugares e atrações como fins em si mesmos, peregrinos estabelecem relacionamentos, caminhando por lugares com reverência e se relacionando com pessoas em cumplicidade, integrando as experiências na construção da maturidade.3. Enquanto turistas são movidos pela próxima atração, na constante busca por evitar a constância e o tédio, peregrinos são movidos diariamente na mesma direção, tendo na constância uma virtude e na perseverança um elemento imprescindível para o cumprimento de sua jornada.4. Enquanto turistas estabelecem relacionamentos frágeis e descartáveis, peregrinos descobrem, especialmente na vivência com aqueles com quem caminham lado a lado na jornada, uma grande fonte de consolo, confronto, encorajamento e sabedoria.5. Enquanto turistas, de forma geral, não possuem qualquer compromisso para com o mundo a sua volta, peregrinos estão numa jornada que os responsabiliza em serem o próximo para aqueles que estão à beira do caminho, bem como “luz” e “sal” na sociedade em que estão inseridos. Pensando um pouco sobre estas duas imagens fui levado a me questionar. Tenho eu, na minha postura para comigo mesmo, para com a comunidade cristã e para com o mundo no qual estou inserido tido uma postura de “turista” ou de “peregrino”? Qual seria o reflexo em nossas vidas, comunidades e sociedades se, na contra mão da cultura, aceitássemos o desafio de vivermos como peregrinos, rejeitando as demandas que tentam no levar a sermos apenas turistas?

quarta-feira, 22 de abril de 2009

ENTRE DESERTOS E PALÁCIOS- POR RICARDO AGRESTE

É preciso concordar com Paulo quando diz que tudo podemos no Senhor.

Ao longo de minha caminhada cristã, não foram poucas as vezes em que me encontrei cercado por circunstâncias adversas. Em diversas ocasiões, carreguei dentro de mim um sentimento de que não conseguiria sair de uma determinada situação. Se não bastassem os problemas externos que me afligiam, meu ânimo se encontrava debilitado e sentimentos contraditórios me deixavam ainda mais confuso. Para completar o cenário caótico, em alguns destes momentos, um outro elemento intensificava ainda mais a crise: a sensação de que Deus não estava ouvindo minhas palavras ou olhando por mim.Apesar de ouvirmos muito pouco acerca da realidade destes momentos, ao longo da jornada de um cristão eles existem de fato. Descrevendo sua angústia em uma destas fases de sua caminhada cristã, João da Cruz chega a definir tal momento como sua “noite escura da alma”. Eu, particularmente, tenho optado por nomeá-lo simplesmente como deserto. O deserto, como espaço geográfico, é um lugar árido e de visual caracterizado pela desolação. Sua imagem transmite a todos a idéia de ausência de vida e iminência de morte. No entanto, é interessante notar que na espiritualidade bíblica o deserto não representa um lugar de perdição e destruição. Muito pelo contrário – nas páginas das Escrituras ele é retratado inúmeras vezes como um lugar onde pessoas são surpreendidas pela presença de Deus e por seu cuidado gracioso para com suas vidas. Neste sentido, o deserto pode se visto como um lugar para onde muita gente se desloca por força das circunstâncias, como aconteceu com Davi, ou voluntariamente, a fim de buscar a presença de Deus, como aconteceu com Jesus. Mas o deserto pode também ser momento existencial caracterizado pelas adversidades, decepções, enfermidades, crises e perdas; um tempo que não gostaríamos de atravessar, mas que, no futuro, nos dará plena consciência de sua importância na construção de nossas vidas. Há pessoas que acreditam que este tempo de deserto pode ser altamente perigoso para sua caminhada com Deus. Elas temem que, diante das pressões externas e lutas espirituais, possam vir a desanimar ou mesmo a se decepcionar com o Senhor, abandonando até mesmo a caminhada. No entanto, as histórias bíblicas nos mostram o contrário. No deserto, servos do Senhor são lapidados e ganham maior consciência do amor de Deus por suas vidas e de sua vocação na história. É ali que, ao invés de se perderem, foram encontrados pelo Pai. Na verdade, existe um espaço muito mais perigoso e nocivo para a genuína espiritualidade do que o deserto. É o que podemos chamar de palácio: o lugar onde experimentamos o poder e a fartura. No palácio, temos a sensação de que tudo está sob nosso controle. No palácio, nem mesmo precisamos de Deus, pois o pão nosso de cada dia está garantido pelas nossas próprias conquistas.Por isso mesmo, as histórias bíblicas e as biografias de homens e mulheres do passado nos revelam que, em sua grande maioria, o espaço em que pessoas mais frequentemente se perdem não é o deserto, mas o palácio. É quando vivem no palácio que abaixam a guarda, passam a confiar demais em si mesmas e se veem cercadas de oportunidades que não tinham antes. É no contexto do palácio que o dinheiro, o sexo e o poder se mostram mais sedutores, levando o ser humano à ruína.Creio que somos convidados a desenvolver nossa espiritualidade ao longo de uma caminhada que envolve tempos de desertos e tempos de palácios. Nos desertos, precisamos encontrar o caminho da confiança no caráter de Deus e da submissão aos seus desígnios, principalmente quando eles não são os da nossa vontade. Mas, nos palácios, precisamos exercitar a humildade de coração e a dependência do Senhor, reconhecendo que tudo o que temos e somos veio de suas mãos – e que as bênçãos não nos são privilégios, mas sim, responsabilidade. Isso porque ambos – tanto os palácios como os desertos – segredam armadilhas próprias. Enquanto desertos são lugares onde a amargura e a desconfiança nos assaltam, nos palácios somos constantemente envolvidos pela tentação de assumirmos o controle de nossas próprias vidas. É tendo em mente a consciência de que nossa espiritualidade é construída através de desertos e palácios que podemos compreender as palavras de Paulo em Filipenses 4.10-13: “Alegro-me grandemente no Senhor (...) pois aprendi a adaptar-me a toda e qualquer circunstância. Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece”. Aprender a cruzar desertos e a viver em palácios é uma tarefa árdua que requer uma vida inteira de muita oração e dependência de Deus. No entanto, é preciso concordar plenamente com o apóstolo quando diz que tudo podemos no Senhor. Só isso pode explicar o fato de que, apesar dos desertos e palácios, ainda estamos firmes – e, apesar de nossos tombos e deslizes, ainda continuamos no caminho.

sábado, 4 de abril de 2009

ESPIRITUALIDADE PELOS MOTIVOS ERRADOS - POR EUGENE PETERSON

Eugene Peterson tem uma vida inteira de livros publicada antes de A mensagem. E poderia-se argumentar que foram suas obras que levaram, pelo menos em parte, à renovação espiritual de pastores e leigos que ocorre hoje. Em livros como Um pastor segundo o coração de Deus, Corra com os cavalos, O pastor contemplativo e O pastor desnecessário, ele expôs a superficialidade do cristianismo e apresentou alternativas que estimulam e revigoram.Significativo notar, então, que Peterson voltou a escrever sobre a vida cristã em A maldição do Cristo genérico, publicado no Brasil pela Mundo Cristão. Esse livro é o primeiro de uma série planejada para cinco volumes, onde ele reunirá, de forma sistemática, temas que vêm abordando há cerca de 30 anos – formação espiritual, a Bíblia, liderança, a Igreja, pastorado e orientação espiritual.O primeiro volume é uma obra-prima sobre teologia espiritual que combina análise cultural e exposição bíblica incisivas com uma visão abrangente e atrativa da vida cristã.Toda a obra de Peterson resultou de seu pastorado, especialmente na Igreja Presbiteriana Christ Our King, que fica em Bel Air, subúrbio de Baltimore, no estado de Maryland, Estados Unidos. Ele fundou a igreja, que tinha cerca de 500 membros 29 anos depois, quando deixou o pastorado. De lá, ele foi para o Seminário Teológico Pittsburgh e depois para a Regent College, em Vancouver, no Canadá. Hoje está “aposentado” e vive em seu estado natal, Montana, porém continua pastor de coração, e se preocupa profundamente com a vida cristã nas igrejas locais.Quando Peterson estava concluindo A maldição do Cristo genérico, Mark Galli, editor-chefe da Christianity Today, conversou com ele sobre temas que surgiram por causa do livro e também por causa da vida de Peterson.CHRISTIANITY TODAY - Que aspecto da espiritualidade causa mais interpretações erradas?Eugene Peterson - Pensar que a espiritualidade é uma forma especializada de cristianismo, alguma coisa da qual se deve possuir um pouco, é um pensamento elitista. Motivações erradas levam a pensar assim. Outras pessoas ficam desanimadas com a idéia: Não sou espiritual. Prefiro futebol, festas ou meu trabalho. Na verdade, eu tento evitar a palavra.Muitos pensam que espiritualidade envolve intimidade emocional com Deus.Trata-se de uma visão ingênua. Espiritualidade é a vida cristã. Seguir Jesus. Não é nada mais do que fazemos há dois mil anos – ir à igreja, receber os Sacramentos, ser batizados, aprender a orar e ler a Bíblia da maneira correta. Nada além dos atos comuns.A promessa de intimidade é certa e errada. Existe intimidade com Deus, que é igual a qualquer outra. Faz parte da essência da vida. No casamento, não se sente a intimidade na maior parte do tempo, nem com amigos. Ela não é fundamentalmente uma emoção mística. é uma forma de vida, aberta, sincera e com certa transparência.A tradição mística não aponta em outro sentido?Uma de minhas histórias prediletas é sobre Teresa de ávila. Ela estava na cozinha, comendo um frango assado. Pegou-o com as duas mãos e começou a morder, devorando-o. Uma das freiras entrou e ficou chocada ao ver a cena. Teresa então falou: “Quando como frango, eu como frango; quando oro, eu oro.”Se você ler a vida dos santos, verá que foram pessoas bem comuns. Há momentos de enlevo e êxtase, um a cada dez anos. E eram inesperados. Eles não faziam nada. Precisamos acabar com a ilusão das pessoas quanto à vida cristã. Ela é maravilhosa, mas não no sentido que muitas pessoas gostariam que fosse.Os evangélicos, porém, dizem que podem ter um “relacionamento pessoal com Deus”. Isso sugere um determinado tipo de intimidade espiritual?Essas palavras perderam o sentido correto em nossa sociedade. Se intimidade significar ser aberto, sincero, autêntico, sem véus, sem atitude de defesa, sem negação de quem eu sou, então tudo bem. Mas, em nossa cultura a intimidade costuma ter conotação sexual, com algum tipo de conclusão. As pessoas buscam intimidade porque desejam mais da vida. Raramente vemos a noção de sacrifício, doação e vulnerabilidade. São essas as duas formas diferentes de intimidade. E a palavra em geral tem a ver com receber alguma coisa da outra pessoa. Isso, de fato, estraga tudo.Usar a linguagem da cultura para interpretar o evangelho é muito perigoso. Nosso vocabulário precisa ser apurado e testado pela revelação, pela Bíblia. Nosso vocabulário e sintaxe são excelentes, e devemos começar a dar atenção a eles, porque a forma como pegamos as palavras sem atenção, para cativar os incrédulos, não é muito boa.A palavra espiritualidade foi deturpada, mesmo nos meios cristãos – isso tem alguma relação com o movimento da Nova Era?A Nova Era é antiga. Está por aí há muito tempo. é um desvio pobre – acho que temos de usar a palavra – para chegar à espiritualidade. O movimento foge do que é comum, cotidiano, físico, material. é uma forma de gnosticismo com um apelo imenso, porque se trata de espiritualidade que não tem nada a ver com lavar pratos, trocar fraldas ou ir trabalhar. Não há muita integração com profissão, gente, pecado, problemas, inconvenientes.Fui pastor a maior parte de minha vida, durante uns 45 anos. Amo ser pastor. Mas, para falar a verdade, as pessoas que mais me incomodam são as que chegam e perguntam: “Pastor, o que tenho que fazer para ser espiritual?” Esqueça esse negócio de ser espiritual. Que tal amar seu marido? Isso é um bom começo. Mas ninguém quer ouvir isso. Ninguém quer pensar em aprender a amar os filhos e aceitá-los do jeito que são.Meu nome não deveria, nunca, estar ligado à espiritualidade.Mas, em geral, está.Sei disso. E há alguns anos assumi essa posição embaraçosa de professor de “teologia espiritual” na Regent College. Agora, o que fazer?Você faz a espiritualidade parecer muito mundana.Não quero sugerir que quem segue Jesus não se diverte, não tem alegria, nem exuberância, nem êxtase. Acontece que não somos o que os consumidores pensam que somos. Quando anunciamos o evangelho nos termos dos valores do mundo, mentimos, porque se trata de uma nova vida. Envolve seguir Jesus, envolve a cruz. Inclui morte, um sacrifício aceito. Abrimos mão de nossa vida.O Evangelho de Marcos é bem claro quanto a isso. Na primeira metade do livro, Jesus mostra como as pessoas devem viver. Cura todos. Então, bem no meio, ele muda. Começa a mostrar como morrer: “Agora que vocês têm vida, vou mostrar como abrir mão dela.” Essa é toda a vida espiritual. Aprender a morrer. E, enquanto aprendemos a morrer, começamos a perder todas as ilusões, começamos a ser capazes de desfrutar de intimidade e amor verdadeiros.Isso envolve um tipo de passividade aprendida, já que nossa forma básica de relacionamento é receber e submeter em vez de dar, ganhar e fazer. Não somos muito bons nisso. Somos treinados para ser positivos, pegar, aplicar, consumir, desempenhar.Arrependimento, morrer para si mesmo, submissão – nada disso é muito atraente para levar as pessoas à fé.Penso que no minuto em que você coloca a questão dessa forma você arruma um problema, porque vemos o mundo consumista, onde tudo se torna um produto que dá alguma coisa. Não precisamos de nada mais. Nada melhor. Buscamos a vida. Estamos aprendendo a viver.Creio que as pessoas estão cansadas da postura consumista, embora estejam viciadas nela. Todavia, se apresentarmos o evangelho em termos de benefícios, colocaremos as pessoas no caminho da decepção. Estaremos mentindo.A Bíblia não foi escrita assim. Nem foi dessa maneira que Jesus andou entre nós. Paulo não pregou nada disso. Onde arrumamos essas idéias? Temos um manual. Temos as Escrituras que, na maior parte do tempo, dizem: “Vocês estão no caminho errado. Voltem. A cultura está envenenando vocês.”Você já percebeu que praticamente toda a cultura de Baal, em Canaã, se reproduz na cultura das igrejas? A religião de Baal busca fazer a pessoa se sentir bem. O culto a ele é uma imersão total no que você vai conseguir receber. E, claro, é um sucesso incrível. Os sacerdotes de Baal reuniam multidões vinte vezes maiores do que o número dos seguidores de Yahweh. Havia sexo, excitação, música, êxtase, dança. “Pessoal, aqui tem garotas! Estátuas, garotas e festas.” Era tudo maravilhoso. E o que os hebreus tinham a oferecer? A Palavra. O que é a Palavra? Bem, os hebreus pelo menos também tinham festas!Ainda assim, o maior atrativo, ou benefício, da fé cristã é a salvação, certo? “Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo.” Não podemos usar isso legitimamente para atrair ouvintes?É a palavra mais sublime que temos – salvação, ser salvo. Somos resgatados de um estilo de vida em que não existe ressurreição. Somos salvos de nós mesmos. Uma definição de vida espiritual é que a pessoa fica tão cansada e saturada de si mesma que procura alguma coisa melhor, ou seja, seguir Jesus.Mas, no momento em que começamos a proclamar a fé em termos de seus benefícios, não fazemos nada além de intensificar o problema do ego. “Com Cristo, você vai ficar melhor, mais forte, mais atraente, vai até ter alguma satisfação.” Isso não passa de mais egoísmo. O que queremos é que as pessoas fiquem entediadas com elas mesmas e passem a olhar para Jesus.Todos conhecemos certo tipo de pessoa espiritual: maravilhosa, ama o Senhor, ora e lê a Bíblia o tempo todo. No entanto, só pensa nela mesma. Não é altruísta. Está sempre no centro de tudo que faz. “Como posso melhorar meu testemunho? Como posso aperfeiçoar o que estou fazendo? Que solução melhor posso encontrar para o problema dessa pessoa?” Tudo eu, eu, eu, sob um disfarce espiritual que não deixa perceber o egoísmo, porque as palavras espirituais nos desarmam.Então, como devemos visualizar a vida cristã?No domingo passado, na igreja, o casal que estava na nossa frente tinha duas crianças bagunceiras. Dois bancos mais trás havia outro casal, com duas crianças também bagunceiras, fazendo bastante barulho. A maioria da congregação é formada por pessoas mais velhas. é gente estabelecida, que já criou os filhos há muito tempo. Então, o culto não foi muito agradável; não foi um momento de adoração muito gostoso. Depois, porém, vi alguns dos idosos abraçando a mãe, tocando nas crianças, sendo simpáticos. Eles poderiam ter ficado irritados.Agora, por que as famílias vão a uma igreja como aquela, já que podem ir a outras que têm atividades especiais para as crianças, ar condicionado e tudo mais? Bem, elas vão ali porque são luteranas. Não se importam de ter momentos desagradáveis! São luteranas norueguesas!E essa mesma igreja recebeu, há pouco tempo, uma jovem com um bebê e um filho de três anos. As crianças foram batizadas há algumas semanas. Mas não tinha nenhum homem com a jovem. Ela nunca foi casada, as crianças têm pais diferentes. Ela apareceu na igreja e pediu para batizar os filhos. Ela é cristã e quer seguir a vida cristã. Um casal da igreja apadrinhou as crianças. Três ou quatro casais da igreja tentam se aproximar da jovem todos os domingos.Agora, onde está a “alegria” nessa igreja? São noruegueses sérios! Mas há muita alegria. Há vida abundante, mas não da forma que a pessoa que não é cristã entende vida abundante. Acredito que há muito mais coisas acontecendo em igrejas como essa; elas são totalmente contraculturais. Estão repletas de alegria, fidelidade, obediência e cuidado. Mas, com toda certeza, não se percebe isso lendo sobre o crescimento da igreja.E muitos cristãos olhariam para essa igreja e diriam que está morta, que não passa de uma expressão de fé institucionalizada.Existe outra igreja além da institucional? Não existe igreja sem problemas, porque há pecado nela. Mas não existe outro lugar para ser cristão além da Igreja. Há pecado no banco e no mercado. Não consigo entender essa crítica ingênua à instituição. Não entendo mesmo.Frederik von Hugel disse que a instituição da Igreja é como a casca das árvores. Não há vida nela. é madeira morta. Porém, protege a vida que está dentro da árvore. Com isso, a árvore cresce cada vez mais. Se removermos a casca, poderá adoecer, desidratar-se e morrer.Então, sim, a igreja está morta, mas protege alguma coisa viva. E quando se tenta ter uma igreja sem casca, ela não dura muito. Desaparece, fica doente, tende a contrair todo tipo de enfermidade, heresia e narcisismo.Quando escrevo, tenho a esperança de recuperar o senso de realidade da congregação – o que ela é. é um dom do Espírito Santo. Por que teimamos em idealizar aquilo que o Espírito Santo não idealiza? Não há, na Bíblia, nenhuma idealização da Igreja. De lá para cá temos dois mil anos de história. Por que demoramos tanto para entender?Depois da Reforma, entretanto, defendemos a idéia de que a Igreja pode ser reformada.Isso ainda não aconteceu. Sempre defendo reformas, mas pensar que podemos ter uma igreja totalmente reformada não passa de tolice.Acredito que o pecado mais comum entre os pastores, talvez especialmente os pastores evangélicos, é a impaciência. Temos um alvo, uma missão. Vamos salvar o mundo. Vamos evangelizar todo mundo, fazer tudo que é bom e encher as igrejas. Isso é maravilhoso. Todos os alvos são corretos. Mas é um trabalho lento, muito lento, esse de lidar com almas, trazer as pessoas a uma vida de amor e alegria diante de Deus.Então ficamos impacientes, começamos a tomar atalhos e usar todo tipo de meios. Falamos sobre os benefícios. Manipulamos as pessoas, ameaçando-as. Usando uma linguagem que é incrivelmente impessoal – que ameaça e manipula.Não é comum pensar na igreja como ameaçadora.Sempre que se usa culpa como instrumento para conseguir que as pessoas façam alguma coisa – seja ela boa, má ou neutra – acontece uma ameaça. E há também a linguagem de manipulação – convencer as pessoas a participarem de um programa, a se envolverem – em geral com alguma promessa.Tenho um amigo que faz isso como ninguém. Diz sempre: “é preciso identificar as necessidades das pessoas. A partir daí, construímos um programa que atenda essas necessidades.” é muito fácil manipular as pessoas. Estamos tão acostumados a ser manipulados pelas indústrias da imagem e da publicidade e pelos políticos que praticamente não percebemos que estamos sendo manipulados.Essa impaciência que leva a abandonar os métodos de Jesus para realizar a obra de Jesus é o que destrói a espiritualidade, porque usa meios não-bíblicos, contrários a Jesus, para fazer o que ele fez. Por esse motivo a espiritualidade, hoje, está tão desvirtuada.Mas muitos pastores vêem gente sofrendo em casamentos problemáticos, viciada em drogas, presa na cobiça. Com toda razão, desejam ajudar agora, e usam qualquer método que funcione.Tudo bem, mas alguma coisa sempre dá errado quando há impaciência. Como atender essa necessidade? Seguimos o exemplo de Jesus ou da cultura?Espiritualidade não se relaciona a fins, benefícios, coisas; ela tem a ver com meios. é como agimos. Como vivemos na realidade?Então, como podemos ajudar essa gente? As necessidades são imensas. Bem, fazemos como Jesus fez. Uma coisa de cada vez. Não podemos fazer a obra, o evangelho do reino, de forma impessoal.Vivemos na Trindade. Tudo que fazemos precisa estar no contexto da Trindade, ou seja, é pessoal, relacional. No instante em que começamos a agir impessoalmente, funcionalmente, voltados para as massas, negamos o evangelho. E, mesmo assim, isso é o que mais fazemos.Jesus é a Verdade e a Vida, mas, primeiro, é o Caminho. Não é possível fazermos a obra de Jesus com os métodos do diabo.Isso me preocupa, porque muitos pastores ficam limitados com essas metodologias impessoais. Não há relacionamento nelas. Assim, voltam-se para o desempenho e o sucesso. Tudo é muito fácil em nossa cultura, pelo menos se você for alto e tiver um belo sorriso. E eles acabam perdendo a alma. Depois de 20 anos, não há mais nada neles. Alguns se deterioram. Tentam fazer tudo e não funciona, de modo que desistem, ou passam a fazer outra coisa. Provavelmente, 90% dos casos de adultério entre os pastores não se relaciona com a lascívia, mas sim com o tédio de não ter a vida romântica que achavam que iam ter.O que aconteceria se pensássemos em termos de relevância e não de necessidades? Muitos cristãos tentam pregar para a geração X ou Y, ou para os pós-modernos, ou para algum subgrupo, como músicos ou ciclistas – gente que considera a igreja típica irrelevante.Quando começamos a adequar o evangelho à cultura, seja ela dos jovens ou desta geração ou de qualquer outro tipo, extipamos a essência do próprio evangelho. A mensagem de Jesus Cristo não trata do reino deste mundo. Fala de outro reino.Meu filho Eric organizou uma igreja nova há seis anos. Os presbiterianos têm um treinamento para novos pastores, onde eles aprendem o que devem fazer. Eric foi participar. Um dos professores disse que ele não deveria usar toga nem estola: “Você precisa se colocar no mesmo nível desta geração.”Eric, sendo bom aluno e desejoso de agradar os colegas, não usava a toga. A igreja, no início, se reunia no auditório de um colégio. Ele começou a usar terno todos os domingos. Porém, quando chegou o primeiro domingo do Advento e ele ia servir a Santa Ceia, ele me disse: “Pai, eu não consegui fazer como o professor disse. Acabei vestindo minha toga.”Os vizinhos dele, Joel e a esposa, freqüentavam a igreja. Joel era o estereótipo perfeito do tipo de pessoa para quem se destinava o desenvolvimento das novas igrejas – classe média alta, gerente em alguma empresa, nunca havia sido membro de igrejas, totalmente secular. Eric pensava que ele ia à igreja porque eram vizinhos, ou porque havia amizade entre eles. Depois do culto do Advento, perguntou a Joel o que ele tinha achado da toga.Ele respondeu: “Chamou nossa atenção. Conversamos sobre isso. Acho que estamos procurando, na verdade, um espaço sagrado. E nós dois concordamos: achamos que encontramos.”Creio que precisamos ver o que é importante. Não vejo as pessoas se importando muito com o tipo de música ou com o formato do culto. Elas buscam um lugar onde Deus é levado a sério, elas também são, onde ninguém manipula as emoções delas nem suas necessidades de consumo.Por que estamos presos nesse pensamento de publicidade e propaganda? Acho que isso está destruindo a Igreja.Uma outra pessoa poderia entrar na igreja de Eric, ver a toga que ele está usando e ir embora, achando que é uma congregação religiosa e eclesiástica demais.Mas por que alguém vai à igreja, se não quer ser religioso? Para que essa gente vai à igreja?Claro que a situação tem outro aspecto. Se você freqüenta uma igreja onde todos desempenham o papel de religiosos, acabará fazendo o mesmo. Essa mentalidade de representação e desempenho existe na igreja dos surfistas como em qualquer outro lugar – estão todos representando um papel lá, também.Mas aquilo em que estamos envolvidos inclui um mistério imenso. Será que teremos que acabar com o mistério para assumir o controle? A reverência não faz parte do centro da adoração a Deus?E, se apresentamos uma entrega a uma fé despida de todo mistério, onde não há reverência, como as pessoas irão saber que existe algo mais além das emoções e necessidades delas? Está em curso alguma coisa muito maior do que minhas necessidades. Como poderei entender isso se o culto e a adoração na igreja estão centralizados em minhas necessidades?Algumas pessoas diriam que é importante ter um culto de adoração em que todos se sentem à vontade, para, assim, ouvirem o evangelho.Não concordo com isso. Tome o fato que contei, da família sentada à nossa frente no domingo. Ninguém estava à vontade. A igreja inteira foi incomodada.Mas, talvez, a congregação tenha vivido mais o evangelho, ao abraçar aquela pobre mulher, que estava profundamente envergonhada.Nunca saberemos, porque as pessoas não se limitam mais a apenas adaptar o ministério à cultura. Passaram a sacrificar o evangelho.Penso no seguinte teste: Estou agindo como a história, os métodos e as maneiras de Jesus? Estou sacrificando relacionamentos, atenção pessoal, relação pessoal, em prol de um atalho, um programa para conseguir que as coisas aconteçam? Não é possível fazer a obra de Jesus de forma que ele não aprova – mesmo que pareça muito “bem-sucedida”.Uma atitude que creio ser característica minha é permanecer na igreja local. Sou arraigado na vida pastoral, uma vida comum. Então, enquanto todo o glamour e imagem de espiritualidade acontecem em outros lugares, eu, para dizer a verdade, permaneço bem alheio. E olho tudo isso com desconfiança, de certa forma, porque me parece uma situação sem raízes, sem fundamento em condições locais, que são as únicas em que se pode viver a vida cristã.

Uma esquerda religiosa e sem esperança - Filipe Samuel Nunes em Gospelprime

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